DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sábado, 25 de maio de 2013


                      AMÍLCAR CABRAL

                              XLII

                      REGRESSO A LISBOA


Entre 1955 e 1959, Cabral voltou a ser mais engenheiro do que político. Os contactos que mantinha com professores do ISA e com antigos colegas asseguravam-lhe ocupações temporárias em Lisboa. Teve ainda oportunidade de se ocupar de missões agrárias ao serviço de grandes companhias angolanas. Durante este período, trabalhou para a Sociedade Agrícola do Cassequel, para a Companhia Angolana de Agricultura e para as fazendas Tentativa, São Francisco e Nhia. Deslocou-se também pela Europa, para visitar centros de produção de açúcar de beterraba. Foi aproveitando as viagens para estreitar os antigos contactos com os líderes nacionalistas das colónias portuguesas que tinham deixado o país.
Amílcar e Maria Helena viviam agora num bom apartamento da Avenida Infante Santo. As dificuldades económicas dos tempos de estudo tinham ficado para trás.
    Muitas organizações políticas fazem gala de apresentar uma data precisa de fundação, mesmo quando os seus trajetos se desenrolaram de forma progressiva e até os nomes adotados se foram modificando ao longo do tempo. Na versão oficial, o PAIGC terá sido fundado em 1956, em Bissau, por Amílcar Cabral, Aristides Pereira, Júlio de Almeida, Elisée Turpin, Fernando Fortes e Luís Cabral. Não terá sido assim. Julião Soares, autor de Amílcar Cabral - vida e Morte de um Revolucionário Africano, afirma que Cabral não  esteve nesse ano em Bissau. Certo é que o PAI só ganharia o GC e a bandeira em Dakar, em outubro de 1960.
Enquanto residiu na capital portuguesa, Cabral foi sempre prudente na sua atividade revolucionária. Ao contrário de alguns dos seus companheiros de estrada, como Neto, o líder do PAIGC nunca foi incomodado a sério pela PIDE. Era um homem culto, inteligente, firme e cuidadoso. Estaria mais talhado, como Léopold Senghor, para chegar ao poder pelo voto e não pelas armas. Se assim foi, o destino trocou-lhe as voltas. A História impôs-lhe outro caminho.
No final de 1959, Amílcar Cabral almoçou num restaurante de Setúbal com Ário de Azevedo, seu professor e amigo, que lhe propôs um novo emprego. Desta vez, a resposta foi negativa. Amílcar não voltaria a trabalhar em África. Resolvera, finalmente, dar um rumo diferente à sua vida. A independência da Guiné-Conakri, declarada no ano anterior, marcara-o profundamente. Passara a haver condições para iniciar o processo que iria pôr fim ao colonialismo português. Era tempo de acordar a Guiné-Bissau. O PAIGC esperava por ele.
Cabral nascera na Guiné e era filho de cabo-verdianos. Não havia ninguém tão bem preparado como ele para assumir o comando dos povos da Guiné e Cabo Verde na luta revolucionária. Escreveu Agostinho Neto: Já não sou o que espera. Sou aquele por quem se espera. O verso poderia aplicar-se a Amílcar Cabral.
Por essa altura, o nacionalismo negro era essencialmente pan-africano. Ocorreram em África várias tentativas de uniões de jovens estados. Dessas experiências, ficou apenas a Tanzânia.
 Não existindo condições para a luta de guerrilha nas ilhas do arquipélago cabo-verdiano, Amílcar Cabral desencadeou a guerra de libertação nas selvas da Guiné então portuguesa.
                  


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