DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sábado, 21 de dezembro de 2013

            CARRERO BLANCO



Completaram-se ontem quarenta anos sobre a morte de Luís Carrero Blanco. 
No dia 20 de dezembro de 1973, Carrero Blanco, chefe do governo espanhol, foi vítima de um atentado bombista. Regressava da igreja de S. Francisco de Borja, onde assistira à missa, como era seu hábito, e voltava para casa, pela Calle Claudio Coello, quando a sua vida foi interrompida. A bomba estava colocada num túnel escavado sob a rua e tinha sido acionada a distância, no momento da passagem do automóvel. Com o almirante, morreram o inspetor da Polícia Bueno Fernandez e o motorista Pérez Mogena.


Carrero Blanco foi avisado da possibilidade de ocorrência de um atentado, mas não o levou suficientemente a sério e não se precaveu. Manteve os horários e os percursos habituais e recusou deslocar-se num veículo blindado.

                                 «Wilson»
A ETA designou este assassinato por «Operação Ogro». Um grupo de militantes, entre os quais se contavam Pedro Ignacio Pérez Beotegui, conhecido pelos pseudónimos de «Wilson» e «Txikia», alugou uma cave na rua e escavou um túnel onde foram colocados perto de 100 quilos do explosivo Goma-2. 


O rebentamento foi tão forte que fez subir a viatura subiu à altura dos telhados dos prédios vizinhos. 


Ocorreu um quarto de hora antes do início do julgamento de dez membros das Comissiones Obreras, um sindicato proibido na altura.


Vamos à história pessoal. Luís Carrero Blanco nasceu em 1904 em Santoña (Cantábria). Entrou cedo para a Escola Naval e participou na campanha de Marrocos, que teve lugar entre 1924 e 1926.
Quando a guerra civil rebentou, era Diretor da Escola Naval de Guerra, em Madrid. Refugiou-se, primeiro na embaixada mexicana e depois na francesa. Em junho de 1937, conseguiu passar para uma zona controlada pelos nacionalistas.
Findo o conflito, comandou navios de guerra e foi Chefe de Operações do Estado-Maior da Marinha. Alinhou pelos que defendiam a neutralidade de Espanha na II Grande Guerra.


Aproximou-se gradualmente de Francisco Franco. Foi Subsecretário da Presidência, Ministro da Presidência, Vice-presidente e Presidente do governo. Era um franquista com alguma abertura para o futuro. Opôs-se à Falange e promoveu a modernização do Estado espanhol. Apoiou o regresso do país à monarquia, abrindo o caminho de Juan Carlos para o trono.


 Era o delfim do caudilho, o homem de quem se esperava a continuação da Direita espanhola no Poder. Seria também um fiel da Opus Dei.


Até aqui, nada parece haver que justifique polémica. Fará parte da lógica do sistema uma organização separatista atentar contra os símbolos do Poder. Acontece porém que a Embaixada dos Estados Unidos da América do Norte em Madrid dista pouco mais de uma centena de metros da cave onde se abriu o túnel até ao meio da rua. Os etarras tiveram de fazer barulho para escavar. Terão procurado máscara sonora nos trabalhos de um escultor que trabalhava na vizinhança. Depois, houve que passar cabos elétricos pelo exterior dos prédios. Ainda não era o tempo das explosões telecomandadas. Nasceu um boato: as viaturas da embaixada americana habitualmente estacionadas na rua Claudio Coello não se encontravam lá naquele dia.
Pessoalmente, acho que os americanos não são suficientemente parvos para resolverem poupar meia dúzia de automóveis, correndo o risco de se verem envolvidos num magnicídio em terra alheia. A teoria conspirativa enriqueceu, porém, quando, em 1978, o único indivíduo que avistara o «homem da gabardina branca» que supostamente entregara aos etarras os horários e os percursos habituais do almirante Carrero Blanco no Hotel Mindanao, em Madrid, foi abatido por uma organização paramilitar.
Vêm, a seguir, as coincidências. O Secretário de Estado americano Henry Kissinger esteve reunido durante várias horas em Madrid com Carrero Blanco na véspera do atentado. Repito que os americanos não são estúpidos e não envolveriam a segunda figura política do país num assassinato.
Passados anos, porém, há sempre quem relacione outras coincidências. Por dever de ofício, Kissinger esteve em Roma pouco antes do rapto de Aldo Moro. Gianni Agnelli, o patrão da FIAT cognominado «rei de Itália» chegou a afirmar que os brigadistas eram os executores, mas que os mandantes viviam na Itália e nos Estados Unidos.
As ligações da extrema-direita à extrema-esquerda são reais, se não rotineiras, nos fabulários europeu e latino-americano. Segundo alguns, a Gladio e a CIA infiltraram muitas organizações revolucionárias europeias no pós-guerra. Depois, há sempre quem divulgue informações que, verdadeiras ou não, alimentam a confusão na mente do cidadão comum. Algum tempo antes da morte do almirante Carrero Blanco, foram entregues na base militar de Torrejon, em Madrid, dez minas antitanque provenientes de Fort Bliss, nos EUA, do tipo das usadas no Vietname. De que serviriam em Espanha? É fácil especular. Ninguém conhece o seu paradeiro. Teria alguma sido colocadas no túnel aberto pelos etarras na Calle Claudio Coello?

Fotos: Internet

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

             

  O ASSASSINATO DE TRÓTSKI 

Depois de Trótski, que dá nome ao livro, o decaedela prossegue a publicação de capítulos relacionados com mortes violentas de pessoas conhecidas. Lembro que se trata do diário de um assassino e que as opiniões expressas no texto são do personagem de ficção e não do autor.


        EDUARDO MONDLANE

                                


Eduardo Mondlane foi executado em Dar-es-Salaam com recurso a uma encomenda bomba. Diz-se que o carrasco pertencia ao braço português da Gladio. Foi um trabalho bem feito.
A PIDE tinha conseguido infiltrar parte dos partidos revolucionários moçambicanos. Na manhã do dia 3 de fevereiro de 1969, Mondlane, presidente da FRELIMO, abriu uma encomenda armadilhada contendo a tradução francesa das Obras Escolhidas do teórico marxista russo George Plekhanov. Consta que a violência da explosão lhe decepou as mãos e lhe separou o tronco em duas partes.
                        

Eduardo Mondlane foi o primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) que resultara da fusão de três organizações independentistas moçambicanas com bases sociais e étnicas próprias, sediadas em países diferentes: a União Democrática Nacional de Moçambique (UDENAMO), a Mozambique African National Union (MANU) e a União Nacional Africana para Moçambique Independente (UNAMI). A junção dos três movimentos fora apadrinhada pelo presidente da Tanzânia, Julius Nyerere. Uria Simango, pastor presbiteriano, foi eleito vice-presidente.
                     


Mondlane era filho de um chefe tradicional moçambicano e foi educado e protegido por uma missão presbiteriana suíça. Estudou primeiro na região de Manjacaze e depois na África do Sul. Fez uma passagem breve pela Universidade de Lisboa, onde teve oportunidade de conhecer Agostinho Neto e Amílcar Cabral. Seguiu depois para os Estados Unidos da América do Norte onde se licenciou em Sociologia. Já doutorado, ensinou História e Sociologia na Universidade de Syracuse, em Nova Yorque. Trabalhou para as Nações Unidas e foi contactado por Adriano Moreira, mas não se entendeu com ele. Enquanto o ministro português o convidava para colaborar com a administração colonial de Lisboa, Eduardo Mondlane tentava persuadir Moreira a aceitar a independência das colónias que Portugal detinha em África.
                      
Mondlane e Simango

Em 1961, Mondlane passou por Moçambique e estabeleceu contacto com diversos dirigentes nacionalistas, tendo em vista o lançamento da luta armada de libertação nacional. Eram precisos apoios externos. Os primeiros guerrilheiros, entre os quais se contava Samora Machel, foram preparados na Argélia. Os seguintes não precisaram de se deslocar para tão longe: a vizinha Tanzânia deu-lhes hospitalidade e condições de treino.


                                                      Samora Machel

A guerra começou em Setembro de 1964, com um ataque ao posto administrativo de Chai, na província de Cabo Delgado, a uma centena de quilómetros da fronteira com a Tanzânia. Os ventos da História sopravam contra o colonialismo e a revolução propagou-se a boa parte do território moçambicano.
A luta de independência não decorreu sem incidentes: Lázaro Nkavandame, secretário provincial da FRELIMO em Cabo Delgado, desviou em proveito próprio dinheiro do Partido. Mateus Gwengere, padre católico que mobilizara um número elevado de jovens para o movimento de libertação, protestou contra a prática de enviar quase todos os rapazes para a guerra, em vez de os mandar estudar. Em Maio de 1968, ocorreu um motim e muitos estudantes abandonaram a FRELIMO. Ainda nesse mês, ocorreu uma cisão tribalista, com os macondes a exigirem a independência imediata de Cabo Delgado.
O II Congresso da FRELIMO reelegeu Mondlane e Simango e decidiu continuar a luta pela «independência total e completa» de Moçambique e não apenas de parte do país.

                                                       Dar-es-Salaam

O primeiro presidente da Frente de Libertação de Moçambique morreu na Residencial/Bar da americana Betty King, secretária da sua esposa, em Oyster Bay, na capital tanzaniana. Mondlane passava ali muito do seu tempo livre. A encomenda armadilhada rebentou às 9 horas da manhã de 3 de fevereiro de 1969. Nem Betty, nem a maioria dos empregados, se encontrava no local. Apenas estava o cozinheiro que ainda serviu um chá a Mondlane.

                                               Janet Mondlane

Janet Mondlane viajara para a Suíça e só soube do crime à noite. À data do assassinato, Joaquim Chissano era o secretário particular do presidente e o diretor dos serviços de segurança da FRELIMO. Era ele quem abria habitualmente a correspondência. Não o fez naquela manhã.



 Joaquim Chissano

A encomenda foi preparada em Lourenço Marques, pela polícia política portuguesa, a PIDE. Não se sabe como chegou às mãos e Mondlane.
Existem informações cruzadas que permitem afirmar, com alguma segurança, que o homem que fabricou e enviou a bomba que faria em pedaços o presidente de FRELIMO foi o agente da PIDE Casimiro Monteiro. De acordo com Geoffrey Sawaya, chefe dos serviços secretos da Tanzânia, no livro bomba teria sido usado material explosivo fornecido por uma empresa japonesa à Casa Praff, sita no n° 5 da rua Joaquim Lapa, em Lourenço Marques.
A PIDE teria sido ajudada dentro da FRELIMO, por Lázaro Nkavandame e por Silvedo Nungu. Este último foi preso quando tentava fugir para Moçambique. Tinha sido secretário administrativo do Comité Central e membro da Direção do Departamento de Informação e Propaganda da FRELIMO. Morreu na prisão, no seguimento de uma oportuna greve de fome.
A espionagem italiana do Servizio Informazione Difesa (SDI) atribuiu o crime a uma rede envolvendo a PIDE e a AGINTERPRESS, o engenheiro Jorge Jardim, Uria Simango e Robert Leroy, espião em Dar-es-Salam. Estaria em causa o braço português da Gladio.
Segundo testemunho do chefe de redação do jornal Notícias da Beira, o engenheiro Jorge Jardim compareceu na redação no dia do atentado (facto, ao que parece, inédito) e aguardou várias horas pela chegada duma «importante notícia».

      Jorge Jardim e o presidente do Malawi, Hastings Banda

Desconhece-se quem transmitiu à PIDE a informação do interesse de Eduardo Mondlane pela tradução francesa das obras de Plekhanov. O “bufo” teria de andar perto do presidente da FRELIMO. Sabe-se que maçonaria portuguesa tentou recrutar "maçons pretos" entre a hierarquia do poder em Moçambique. A “Opus Dei”, ligada ao fundamentalismo católico, fez o que pôde para se aproximar dos círculos moçambicanos do Poder. Não há dados que sugiram o envolvimento de qualquer destas organizações no homicídio de Mondlane. Curiosamente, as declarações de Silva Cunha, antigo ministro de Salazar e Caetano, e de António Vaz, dirigente da PIDE em Moçambique, coincidem no essencial: a eliminação do líder da FRELIMO não era do interesse do governo português. Mondlane seria o “menos mau” e certamente melhor que Samora Machel. Nem sempre as orientações políticas e a programação dos serviços secretos coincidem no lugar e no tempo.
A morte de Mondlane terá afastado a FRELIMO dos americanos, aproximando-a da China.


Urias Simango, o vice-presidente de Mondlane e o padre Gwengere terão sido executados em Metelela, no Niassa.
                         
Plekhanov

Pessoalmente, acho curioso o interesse de Mondlane, de reconhecida formação americana, pelo pai ideológico do marxismo russo. Mais velho que Lenine, Plekhanov ainda conheceu pessoalmente Frederick Engels. Opôs-se aos bolcheviques (chegou a chamar a Lenine “alquimista da revolução”) e abandonou a Rússia após a Revolução de Outubro. Continuou a escrever e a pensar. Considerava o marxismo uma doutrina mais materialista que idealista e achava que a Rússia teria de passar por um estado capitalista de desenvolvimento antes de se tornar socialista.
As guerras libertam os sentimentos mais bárbaros dos humanos e são fonte de dramas e comédias. A morte de Joana Simeão é difícil de classificar. Assumiu-se como pacifista e aceitou a política de «autonomia progressiva» delineada por Marcelo Caetano para a independência das colónias portuguesas.
                                 
Joana Simeão

A sua linha de pensamento não se afastaria muito da de Mondlane. Foi dirigente da FRELIMO e da COREMO, mas afastou-se das duas organizações. Apelou à «constituição de uma frente interna formada por elementos lúcidos calmos e frios das comunidades étnicas presentes em Moçambique (negra, mestiça, branca e asiática)» que seria «a voz autêntica vinda do interior de Moçambique e que imporia ao exterior a solução nossa a problemas nossos.» Fundou a Frente Comum de Moçambique (FRECOMO), com o objectivo de aglutinar as forças políticas não alinhadas com a FRELIMO.
Após o 25 de Abril, a situação política em Moçambique não favoreceu o pluralismo democrático. Joana Simeão foi presa e fuzilada.
Encerrado o drama, teve início a comédia.
As autoridades moçambicanas nunca reconheceram a sua execução extra-judicial. Oficialmente, Joana ausentara-se para “parte incerta”.
O seu segundo marido, Francisco Joaquim Manuel, acabou por se ligar a outra mulher e quis casar-se outra vez. Reclamou a situação legal de viúvo, mas a certidão de óbito da sua esposa não existia. Pelo menos, não foi encontrada. Legalmente, Joana Simeão continuava viva.
Francisco Manuel foi aconselhado a pedir divórcio com a alegação que “Joana abandonara o lar”. Depois de perseverar vários anos, acabou por aceitar o conselho. O processo não foi simples. O Ministério Público do Estado que a assassinou encarregou-se oficialmente da sua defesa e levou a sério a sua tarefa. Afirmou representar um “ausente” e não um “em parte incerta” pedindo a absolvição da ré pela acusação de abandono do lar.
No dia 24 de Abril de 2006, o Tribunal Judicial da Província de Inhambane, fez publicar no diário “Notícias” a intimação para a reaccionária se apresentar no prazo de 20 dias. A notificação foi assinada pelo Presidente do Tribunal, José António Cândido Sampaio, na “Acção Ordinária Declarativa de Divórcio Litigioso nº 19/05.
A intimação não foi transmitida por mesa de pé-de-galo e Joana Simeão não se apresentou. Após um processo que durou cerca de três anos, o viúvo Francisco Joaquim Manuel lá conseguiu o estatuto de «divorciado».
Segundo Barnabé Lucas Nkomo, que escreveu o livro «Uria Simango – Um Homem, Uma Causa», Simango e Joana Simeão não terão sido fuzilados, mas queimados vivos com gasolina, juntamente com outros «reaccionários». 

Urias Simango e o padre Mateus Gwengere, no campo da morte,
face a Marcelino dos Santos e Samora Machel

O governo português sai enlameado desta questão. Foram oficiais portugueses do MFA quem, a 26 de Outubro de 1974, se dirigiram à residência de Ahmed Haider, na cidade da Beira e prenderam Joana Simeão. O MFA actuava a pedido do Governo de Transição de Moçambique, chefiado por Joaquim Chissano. Joana foi transferida para Lourenço Marques (Maputo) e encarcerada na antiga prisão da PIDE na Machava, então dirigida pelo Batalhão de Cavalaria 8424 das forças Armadas Portuguesas.
Joana Simeão apelou para o almirante Vítor Crespo, pedindo justiça. O Alto-comissário português entregou a detida ao Governo de Transição de Moçambique.

FOTOS: INTERNET

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

                     TRÓTSKI


                                II

ASCENÇÃO DE STALIN. EXPULSÃO DA URSS

   Em Março de 1918, Leon Trótski foi nomeado Comissário do Povo para os Assuntos Militares e Navais e chefe do Supremo Conselho Militar. Era o comandante do Exército Vermelho e respondia apenas perante a direção do Partido Comunista.
A guerra era agora civil. Tornava-se indispensável transformar os pequenos destacamentos independentes numa grande e disciplinada máquina militar, necessariamente não partidária. Trótski introduziu o recrutamento forçado e aceitou a colaboração de oficiais czaristas, vistos por boa parte dos bolcheviques como traidores potenciais. Os efetivos do Exército Vermelho subiram de menos de 300.000 em maio de 1918 para cerca de um milhão em outubro do mesmo ano. Foram introduzidos nas unidades militares os comissários políticos, que deveriam assegurar a lealdade dos antigos oficias do exército imperial.
Trótski esforçou-se por implementar no Exército Vermelho a seleção dos comandantes pelo mérito. Promoveu a postos importantes antigos oficiais czaristas que demonstraram a sua competência em combate e não se coibiu de mandar fuzilar uns tantos militantes comunistas que se acobardaram frente ao inimigo. Entregou as decisões puramente militares aos oficiais profissionais. Era, de facto, o principal comissário político do Exército Vermelho.
Os pontos de vista de Trótski foram muito contestados, inclusive por Estaline e Lenine, mas o Exército Vermelho continuava a crescer e, já com cerca de três milhões de soldados, enfrentou com sucesso 16 exércitos inimigos.
Durante o ano de 1921, os partidários de Lenine e Trótski equilibravam-se no Politburo. No 10º congresso do Partido, em maio de 1921, a balança de poder inclinou-se para o lado de Lenine.


Entretanto, a saúde de Vladimir Ilitch Ulianov deteriorou-se. O líder da revolução russa sofreu três acidentes vasculares cerebrais. O primeiro deixou-o com paralisia dos membros direitos e dificuldades na fala. Recuperou parcialmente. Em dezembro de 1922, o segundo agravou-lhe a hemiparesia e forçou-o a abandonar a atividade política. O terceiro acidente vascular ocorreu em março de 1923. Lenine não voltaria a falar. Permaneceu acamado até à sua morte, em 21 de janeiro de 1924.
Com Lenine incapacitado, Estaline, Zinoviev e Kamenev constituíram um triunvirato destinado a impedir que Lev Trótski, o segundo personagem mais importante do Partido e o herdeiro presumível de Lenine, tomasse conta do Poder.


                                   Trótski, Lenine e Kamenev
Os tempos tinham mudado e muitos bolcheviques pensavam que a época da turbulência revolucionária representado por Trótski chegara ao fim, sendo necessário estabilizar a Rússia. Por outro lado, Estaline aproveitou-se habilmente do seu cargo de secretário-geral para dominar o aparelho do Partido. Nomeava os funcionários locais, o que lhe permitia controlar a maioria dos delegados ao Congresso, fazendo eleger para o Comité Central homens da sua confiança.



O novo líder livrou-se da concorrência logo que pôde. Os seus aliados Zinoviev e Kamenev cada vez tinham menos peso político. Trótski, o mais brilhante dos seus adversários, foi afastado do Poder.
No final de 1922, Estaline resolveu fundir as repúblicas soviéticas emergentes num estado federal, a União das Repúblicas Soviéticas Socialistas, claramente dominada pela Rússia.


A economia soviética atravessava dificuldades consideráveis e rebentavam greves um pouco por toda a parte. Trótski atribuía essas dificuldades à falta de democracia entre os bolcheviques. Segundo ele, assistia-se a uma divisão progressiva entre uma hierarquia de funcionários, escolhidos de cima, e as massas populares. As discussões livres dentro do Partido tinham praticamente desaparecido. Eram os funcionários que escolhiam os delegados às conferências e aos congressos.
Era tarde para modificar a situação. A troika controlava o Partido Comunista da União Soviética, através do secretariado-geral José Estaline, e o jornal Pravda por intermédio do seu editor Bukharin. O Politburo já nada mandava. Todas as decisões importantes eram tomadas pela troika. O controle de Trótski sobre os militares ia também sendo minado.
Desenhava-se uma rotura definitiva, também no campo teórico. Trótski continuava a pensar que a União Soviética não se poderia transformar num verdadeiro estado socialista antes de ocorrer uma revolução mundial. Com os pés bem assentes no solo russo, Estaline defendia a construção inicial do socialismo num único país.


Trótski tornara-se um inimigo a abater e era alvo de ataques políticos sucessivos de parte dos aliados de José Estaline. Em Janeiro de 1925 foi obrigado a demitir-se das suas funções de Comissário do Povo para as questões do Exército e da Marinha e de Chefe do Conselho Revolucionário Militar. O seu velho inimigo Zinoviev pediu mesmo a sua expulsão do Partido Comunista. Estaline resolveu desempenhar um papel de moderado e opôs-se a essa medida extrema. Trótski conservou o seu lugar no Politburo, mas já não tinha qualquer poder de decisão.
1925 foi um ano difícil para Leon Trótski, mas não o foi menos para o seu cunhado e adversário Kamenev e para  Zinoviev. O triunvirato que haviam formado com Estaline chegara ao fim. José Estaline tornara-se suficientemente poderoso para se poder desembaraçar dos aliados. Em outubro de 1927, Trótski e Zinoviev foram expulsos do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética. Kamenev teve o mesmo destino em dezembro.
Trótski foi exilado para o Kazaquistão a 31 de Janeiro de 1928. No começo do ano seguinte, seria deportado.
Partiu acompanhado pela esposa, Natália Sedova e pelo filho Lev Sedov. O homem que chefiara o assalto ao Palácio de Inverno do czar Nicolau e que defendera militarmente a revolução comunista contra inimigos poderosos não voltaria a pôr os pés no solo pátrio. Passou quatro anos na Turquia, dois em França e outros dois na Noruega. O presidente mexicano Lázaro Cardenas acabou por o acolher no México.


                              Frida Kahlo e Diego Rivera
Leon Trótski hospedou-se em casa dos pintores Diego Rivera e Frida Kahlo em Coyoacán, na cidade do México. Frida era uma grande pintora, mas sofria de problemas graves na coluna e não parecia mulher atraente. Tal não terá sido o ponto de vista do revolucionário russo, que teve um curto romance com ela.



Incompatibilizado com Rivera, Trótski mudou-se para uma casa situada no mesmo bairro. Por essa altura, sofria de hipertensão arterial e receava vir a ter um acidente vascular cerebral. Terá mesmo pensado no suicídio.


Os problemas de saúde não o impediram de pensar e de escrever. Publicou diversos livros durante esse período. Contam-se entre eles a «História da Revolução Russa» e «A Revolução Traída».
 Longe do seu país, Trótski não deixou de fazer política. Durante algum tempo, receara dividir o movimento comunista internacional e recusara apadrinhar organizações que competissem com a Terceira Internacional. Em 1933, porém, quando os nazis tomaram o poder na Alemanha, mudou de ideias e reuniu os seus apoiantes, para projectar uma alternativa ao Comintern estalinista. A Quarta Internacional foi fundada em 1938, numa reunião em que participaram 25 delegados de 11 países. Pretendia ser uma alternativa revolucionária e internacionalista ao estalinismo.
Leon Trótski opôs-se ao pacto germano-soviético de não-agressão assinado por Molotov e Ribbentrop oito dias antes de rebentar a II Grande Guerra Mundial. O pacto riscava a Polónia do mapa e dividia os países bálticos e a Finlândia entre as duas potências signatárias. Durou até junho de 1941, quando as tropas nazis invadiram a União Soviética, sem aviso prévio.
As ideias políticas de Leon Trótski constituem a base do trotsquismo, uma corrente ainda importante no marxismo contemporâneo. Trótski rejeitou a teoria da implantação do socialismo num único país e advogou a necessidade de uma «revolução permanente». Afirmou que uma nação socialista não poderia viver sem democracia e opôs-se ao totalitarismo estalinista. O conceito de «revolução permanente», habitualmente associado ao trotsquismo, é, contudo, mais antigo. Foi formulado por Marx e Engels, no rescaldo da revolução de 1948. 


                              Frederic Engels e Karl Marx
Entretanto, sob o domínio de Estaline, a Rússia entrava numa fase negra. Em Agosto de 1936, Trótski foi julgado, juntamente com Zinoviev, Kamenev e catorze outros velhos bolcheviques. Os acusados presentes confessaram ter conspirado com Trótski para assassinar Estaline. Quem caía nas mãos da polícia política estalinista confessava tudo o que fosse conveniente. Todos os réus, incluindo Leon Trótski, foram condenados à morte.
Estaline não perdoava aos seus adversários. Trótski era o mais notório de todos. A repressão estalinista assumiu foros de demência. Filhos, genros, noras, netos, e outros parentes de Trótski foram desaparecendo em purgas sucessivas na década de 30. Escapou apenas um neto, que se juntara ao avô no México.
 Em maio de 1940, a casa de Trótski foi assaltada e o seu neto foi ferido a tiro num pé. Um dos guarda-costas foi sequestrado e assassinado. O velho líder bolchevique escapou ileso.
O falhanço deste atentado enfureceu José Stalin. Pavel Sudoplatov, que na altura era subdiretor do Departamento Estrangeiro da NKVD (antecessora da KGB), relata, no seu livro “Operações Especiais”, as circunstâncias em que foi decidida a eliminação física de Trótski:
 «Estaline franziu o cenho. Tinha o cachimbo na mão, apagado, embora cheio de tabaco. Em seguida, com o jornal do dia no colo, acendeu um fósforo, aproximou o cinzeiro, num gesto que aqueles que o conheciam bem antevia uma decisão crucial. Beria opinou que o Serviço de Inteligência Estrangeiro deveria mudar as suas tradicionais prioridades às vésperas de uma guerra de grandes proporções que se avizinhava. Trótski significava uma séria ameaça para os preparativos de guerra da URSS. Beria sugeriu que me pusessem no comando de todas as operações anti-trotskistas da NKVD, a fim de infligir o golpe decisivo no movimento trotskista. Trótski, era o «pior inimigo do povo». No movimento trotskista não há figuras importantes além do próprio Trótski, interrompeu Estaline. Eliminado Trótski, a ameaça desaparece.
Estaline pôs-se de pé e empertigou-se. Em tom baixo, escandindo as palavras, ordenou: Trótski deve ser eliminado antes que termine o ano e a guerra ecluda. E prosseguiu: como prova a experiência da Espanha, sem a eliminação de Trótski não podemos confiar nos aliados da Internacional Comunista, caso os imperialistas ataquem a União Soviética. Terão grandes problemas para levar a cabo sua tarefa de desestabilizar a retaguarda dos inimigos mediante sabotagens e guerrilhas se tiverem de fazer frente à traidora infiltração dos trotskistas em suas fileiras...»
A 20 de Agosto de 1940, Trótski foi atacado em casa pelo agente soviético Jaime Ramón Mercader del Río Hernández, que usava também os nomes de Jacques Monard ou de Frank Jacson.
 Ramón Mercader nasceu em Barcelona mas passou boa parte da juventude em França. Ainda jovem, nos meados dos anos 30, colaborou com organizações comunistas espanholas. Chegou a estar preso durante algum tempo.


                                          Ramón Mercader
Pouco antes do começo da guerra civil espanhola, recebeu treino de guerrilha em Moscovo. No final, foi nomeado agente no exterior do Comissariado do Povo para Assuntos Internos da URSS (NKVD).
Apresentou-se a Trótski com o nome de Frank Jacson e ganhou a sua confiança ao referir as suas relações com o movimento da Quarta Internacional na França e nos Estados Unidos.
Na tarde de 20 de Agosto apresentou-se na casa de Coyoacán e encontrou Trótski no quintal. Pediu-lhe a opinião sobre um artigo que acabara de escrever. Entraram para o escritório de Trótski. No decurso do julgamento, o assassino descreveu o crime:
 «Coloquei a minha capa de chuva na mesa, de forma que fosse capaz de tirar o “piolet” (pequena picareta de alpinismo) que estava dentro do bolso. Quando Trotski começou a ler meu artigo, retirei o “piolet” e, com os olhos fechados, dei-lhe um golpe na cabeça. Trótski emitiu um grito que eu nunca esquecerei. Um longo aaaa, interminavelmente longo, eu penso que ainda ecoa em meu cérebro. Depois, saltou em cima de mim e mordeu-me na mão. Ainda tenho as marcas de seus dentes. Empurrei-o e ele caiu no chão. Então, levantou-se e saiu do escritório a cambalear.»



Ao ouvir o ruído, os guarda-costas de Trótski precipitam-se para a sala e quase mataram Mercader. A vítima travou-os. Era preciso interrogar aquele homem. Trótski foi levado para um hospital e ainda foi operado. Faleceu no dia seguinte.
Entregue às autoridades mexicanas, Mercader recusou revelar a sua identidade verdadeira. Foi condenado a 20 anos de prisão. Nunca referiu as suas ligações à NKVD.
Cumpriu a totalidade da pena. No final, foi recebido em Cuba por Fidel Castro. No ano seguinte, deslocou-se à URSS e recebeu a medalha de de Herói da União Soviética, uma das condecorações mais importantes do país. Regressou a Havana, onde acabaria por morrer. Está sepultado em Moscovo.
Não me surpreende que o regime russo tenha gratificado Ramón Mercader pelo facto de o seu silêncio o deixar à margem dum assassinato comprometedor em território americano. Admira-me, sim, a postura castrista. Fico a pensar que, para o regime saído da revolução cubana, o herói da revolução russa de outubro de 1917 era também um traidor à causa do comunismo internacional.


terça-feira, 17 de dezembro de 2013

                        LEON TRÓTSKI


Decidi publicar no decaedela as minhas reflexões sobre sete mortes violentas incluídas no romance O ASSASSINATO DE TRÓTSKI, que estou a ultimar. Uma parte delas foi esclarecida. Os contornos de outros permanecem mal definidos. Começo pela figura que deu o nome ao livro.
 Como este primeiro artigo é extenso, vou dividi-lo em duas partes. 

                                    I

       DA INFÂNCIA AO TRIUNFO 

   DA REVOLUÇÃO BOLCHEVIQUE

Lev Davidovich Bronshtein, que passou à História como Leon Trótski, foi assassinado em Coyacán, no México, a 21 de agosto de 1940. Ia nos sessenta anos e estava a escrever um livro sobre Joseph Stalin.
Trótski nasceu em novembro de 1979 na pequena povoação de Yanovka, situada atualmente em território ucraniano. Os pais tinham aproveitado o projeto de colonização da Crimeia para saírem da área de residência fixada aos judeus russos. Tornaram-se fazendeiros prósperos. Não eram religiosos. Em casa, falava-se russo e ucraniano e não iídiche.


Quando o miúdo fez nove anos, o pai mandou-o estudar para a cidade portuária de Odessa. Trotsky chegou a inscrever-se em Matemática na Universidade Nacional de Odessa, mas interessou-se cedo pela política. Envolveu-se na actividade revolucionária e aproximou-se do marxismo. Aos 17 anos ajudou a organizar em Nikolayev a União dos Trabalhadores do Sul da Rússia. Conheceu a prisão antes de completar 18 anos. Foi detido, juntamente com 200 membros da União, e esperou dois anos pelo julgamento. Aproveitou o tempo de cativeiro para estudar filosofia e, enquanto estava preso, casou com Alexandra Sokolovskaya, sua companheira das lutas políticas.


Foi condenado a quatro anos de exílio na região do Lago Baikal, na Sibéria. A esposa acompanhou-o. Foi na Sibéria que nasceram as duas filhas do casal, Zinaida e Nina.
Durante o degredo de Trótski, a divisão entre os sociais-democratas aprofundou-se. O jornal Iskra (faísca ou centelha em português), sediado em Londres, defendia a formação de um partido revolucionário bem organizado para derrubar o czarismo.
No verão de 1902, Trótski fugiu da Sibéria escondido numa carroça de feno e chegou a Irkutsk, onde os amigos lhe arranjaram um passaporte falso.
Até então, usara o seu nome verdadeiro. Adoptou nessa altura o pseudónimo de Trótski, curiosamente o apelido de um dos seus antigos carcereiros. Logo que pôde, mudou-se para Londres, onde conheceu Plekhanov, Martov e Lenine e se tornou colaborador do jornal Iskra. Por essa altura, eram já profundas as divergências entre Plekhanov e Lenine.
Foi em Londres que Lev Bronshtein encontrou Natalia Ivanovna Sedova, que viria a ser a sua segunda esposa. Divorciou-se de Alexandra, que escapara também da Sibéria com as filhas, mas manteve com ela, ao longo do tempo, um relacionamento cordial. Em 1935, durante as «grandes purgas» de Staline, Alexandra Sokolovskaya foi novamente presa e desterrada. Terá sido avistada pela última vez em 1938, num campo de trabalhos forçados, na Sibéria.
De Natália, Leon Trotsky teve dois filhos, Lev e Sergei. Deu-lhes o apelido de Sedov para tentar protegê-los da polícia czarista.
Os emigrados russos em Londres desenvolviam uma atividade política intensa e frequentemente conflituosa. Deu-se por essa altura a famosa cisão entre bolcheviques e mencheviques.


Trótski nem sempre esteve ao lado de Lenine. Entre 1904 e 1917 gostava de se considerar um «social-democrata sem facção». Esforçou-se, durante anos, por reconciliar as diversas tendência que divergiam no Partido. Ao mesmo tempo, desenvolveu a sua teoria da revolução permanente. Os choques com Lenine e com outros dirigentes russos foram inevitáveis. Vladimir Ilitch chegou a chamar-lhe «judas» e «canalha».



Em S. Petersburgo (então capital da Rússia), em janeiro de 1905, começou uma greve numa fábrica. As condições de vida dos operários russos eram muito más e o protesto alargou-se até englobar 140.000 trabalhadores. Uma marcha pacífica em direção ao Palácio de Inverno foi reprimida a tiro pela guarda do czar. Morreram mais de 1.000 manifestantes. A data ficou conhecida como Domingo Sangrento.
Trótski voltou secretamente à Rússia para apoiar os protestos contra o czar. Empenhou-se na ação política directa, agitando e organizando, mas pouco tempo depois viu-se obrigado a fugir para a Finlândia, onde prosseguiu a preparação da sua obra sobre a revolução permanente.
A agitação social continuava na Rússia. Em outubro, Trótski regressou a S. Petersburgo e empenhou-se no jornalismo revolucionário, sendo eleito pouco tempo depois para a direção do Soviete dos Trabalhadores da cidade. Após a prisão do primeiro presidente do Soviete, Leon Trótski foi escolhido para o substituir.


O Soviete foi cercado pelas tropas czaristas e os seus dirigentes foram presos. Em outubro de 1906, Trótski foi deportado para a Sibéria pela segunda vez na sua vida. Ia nos 27 anos. 
Evadiu-se durante o transporte e regressou a Londres. Fixou depois residência em Viena de Áustria, onde colaborou com o Partido Social Democrata Austríaco durante perto de sete anos. Foi em Viena que fundou o Pravda, um jornal escrito em russo e destinado aos trabalhadores do seu país.
Bolcheviques e mencheviques continuavam a não se entender. Trótski questionou várias vezes a atuação política de Lenine.
Em 1914, a I Grande Guerra pôs em confronto direto a Rússia e o Império Austro-Húngaro. Leon Trótski teve de fugir para a Suíça, para não ser detido como emigrante russo.
Lenine, Trótski e Martov assumiram posições pacifistas face ao conflito armado, enquanto Plekhanov e outros sociais-democratas apoiavam, de certo modo, o esforço de guerra do governo russo. Lenine achava conveniente a derrota russa na guerra. Por outro lado, advogava a rotura com a Segunda Internacional.


Trótski participou na conferência pacifista de Zimmerwald e propôs um compromisso entre os, que como Martov, queriam permanecer na Segunda Internacional e os que, como Lenine, pretendiam a formação de uma Terceira Internacional. A conferência adotou a proposta de Trótski.
O governo francês não apreciou a militância pacifista de Leon Trótski e deportou-o para Espanha. Os espanhóis também o não quiseram e despacharam-no para os Estados Unidos da América. Trótski viveu em Nova Yorque até rebentar a revolução de fevereiro de 1915 contra o czar Nicolau II. Ganhava a vida escrevendo artigos para jornais, em russo e em iídiche.
Tentou seguir para a Rússia, mas o navio em que viajava foi retido pelos britânicos em Halifax. Pôde continuar a viagem após intervenção do ministro russo dos negócios estrangeiros.
Na Pátria, aproximou-se das posições bolcheviques. Destacando-se de novo pela sua capacidade de organização e pelo seu talento para a agitação, foi eleito presidente do Soviete de Petrogrado. Em outubro de 1917, chefiou o Comité Militar Revolucionário que assaltou o Palácio de Inverno, assegurando o triunfo da revolução russa.
Com os bolcheviques no Poder, tornou-se um dos membros iniciais do Politburo. Foi nomeado Comissário do Povo para os Negócios Estrangeiros, com a missão de negociar o armistício como a Alemanha. As negociações não correram bem. O Exército russo, já de si frágil, encontrava-se abalado pela Revolução. Um ataque alemão bem-sucedido obrigou o governo soviético a aceitar o tratado de Brest-Litovski, em março de 1918.
Trótski demitiu-se do cargo, depois de ter sido obrigado a assinar aquele acordo, que prejudicava gravemente os interesses russos.
Viviam-se tempos duros. O recém-formado Exército Vermelho era pequeno, indisciplinado e mal comandado. Alguns líderes bolcheviques sonhavam com um exército constituído por voluntários que elegeriam os próprios oficiais. Trótski considerava que o exército devia ser suficientemente numeroso e que, se os voluntários não chegassem, se teria de recorrer ao recrutamento compulsivo. Sabia também que os oficiais não se improvisavam e que os únicos disponíveis na Rússia haviam servido o czar.