1º - Porque não somos donos da língua portuguesa. Existem cerca de 225 milhões de lusófonos e nós, em Portugal, somos apenas 10 milhões.
Fundámos a sociedade, mas detemos só 5 por cento das acções. Queremos mandar em quem?
Esse notável instrumento de comunicação representa, a par das Descobertas, um dos nossos maiores legados para a cultura universal. Criámo-la, mas constituímos uma minoria das pessoas que a falam. Ela é já muito maior do que nós. Fernando Pessoa, cidadão da palavra, compreendeu isto quando afirmou, há um século: “A minha Pátria é a Língua Portuguesa”.
2º - Porque considero necessário e útil um instrumento regulador.
As línguas são vivas e tendem a diversificar-se em cada dia que passa. Basta pensarmos no crioulo de Cabo Verde e lembrar os escritos de Mia Couto.
As pressões de outros países sobre os PALOPs não vão deixar de crescer e hão-de ter também repercussão linguística.
Dentro em breve, com acordo ou sem ele, os livros escolares dos PALOPs serão feitos no Brasil, onde os custos de produção são mais reduzidos. As telenovelas brasileiras constituem um instrumento poderoso de divulgação da língua. Não somos suficientemente competitivos nessa área.
Quer nos agrade, quer não, se a língua portuguesa perdurar no mundo, será na versão brasileira.
3º - Porque considero melhor existir um mau acordo do que não haver nenhum e deixar a língua à solta, sem nenhum mecanismo que tente, ao menos, regulá-la. São necessárias directrizes que exerçam um papel de contenção e de estruturação nas variantes que estão a nascer espontâneamente, um pouco por toda a parte.
E, tanto quanto sei, o acordo nem é assim tão mau. Não sou linguista e mal me atrevo a meter a foice nesta seara mas, a meu ver, boa parte das alterações propostas vem apenas apressar uma evolução que iria ter naturalmente o mesmo resultado, anos mais tarde. Para que servem as consoantes mudas ou não articuladas?
E não lhe chamem novo! Tem 19 anos, embora tenha sido recentemente ratificado por Portugal. Provavelmente, está ultrapassado. Nos “SMS” dos telemóveis, o K está a fazer ao QU, quando o U não se pronuncia, o mesmo que o F fez ao PH, tempos atrás. Mais tarde ou mais cedo, este fenómeno terá repercussão na escrita formal.
Há questões que ultrapassam os acordos. Em primeiro lugar: quem irá cumpri-lo?
Eu, não! Tenho 66 anos e não vou mudar agora. Sou incoerente? Nem tanto. A mudança deve começar nos bancos da Escola Primária. Será opcional nas Universidades da Terceira Idade… A transição poderá ser fácil se a nova grafia conquistar o seu espaço no Windows.
E os brasileiros? Sabem que são os mais fortes nesta área e que o tempo joga a favor deles. Será que o vão mesmo cumprir?
Tanto dá! Acreditem ou não, tenho poucas saudades do tempo em que farmácia e outras palavras correntes se escreviam com ph.
António Trabulo
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