DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sábado, 1 de junho de 2013

                    
                      AMÍLCAR CABRAL

                             LXVIII

   A ORGANIZAÇÃO DA GUERRILHA                                     



          Do lado da guerrilha, verificou-se relativamente cedo que as primeiras bases criadas no começo da luta armada tinham deixado de corresponder à realidade da situação militar. Por um lado, a maioria dos ataques envolvia efetivos reduzidos. Por outro, constituíam alvos fáceis para a aviação portuguesa. Foi decidido reorganizar os combatentes em grupos mais pequenos que poderiam reunir-se ocasionalmente para iniciativas mais ambiciosas. 
Em novembro de 1964 juraram bandeira os elementos das primeiras unidades do Exército Popular pensado no Congresso de Cassacá. Com guerreiros melhor preparados, foi possível abrir novas frentes de combate. No mesmo Congresso fora criado um Conselho de Guerra que dependia diretamente do secretário-geral e funcionava como estado-maior.
O Exército Popular compunha-se de unidades chamadas bigrupos. Contavam com cerca de 40 elementos cada, podendo ser reforçados.
A organização dos combatentes revolucionários modificou-se ao longo do conflito, de acordo com o equilíbrio de forças e as alterações no modo português de fazer a guerra.
Em 1965, os comandos militares inter-regiões mudaram de nome e de funções. Passaram a ser chamados comandos gerais do norte e do sul. Coordenavam todas ações de combate nas suas áreas. No ano seguinte, passaram a ser designados por comandos de frente.  Em 1969 deu-se nova reorganização. Foi criada a Comissão Nacional das Regiões Libertadas. Em termos militares, o rio Geba passou a separar as frentes norte e sul, as quais foram subdivididas em zonas ou setores.  
Em 1971, ocorreu uma nova reestruturação. A marinha ganhara importância. Passou a ser chamada Marinha Nacional Popular. Juntamente com o Exército Nacional Popular e as Forças Armadas Locais, compunha as Forças Armadas Nacionalistas.
A marinha integrava unidades navais e unidades de fuzileiros, cuja organização assentava também em bigrupos. Em 1971 instrutores russos começaram a treinar em Conakry uma unidade de homens-rãs.
O exército compunha-se de unidades de infantaria, artilharia e grupos especiais. A infantaria continuava a assentar a sua organização nos bigrupos de grande poder de fogo. A dada altura, até as forças coloniais adotaram esse modelo. Três ou quatro bigrupos formavam um corpo de exército. A artilharia compreendia grupos mais ou menos clássicos de 50 homens, unidades de canhões e morteiros com cerca de metade desses efetivos e grupos ainda mais pequenos de foguetões associados a outros meios antiaéreos. Os grupos especiais incluíam comandos, atiradores especiais com miras telescópicas e operadores de lança-granadas foguete (bazucas).
As Forças Armadas Locais substituíam as milícias. Assentavam em grupos de dezanove elementos armados com espingardas Simonov, pistolas-metralhadoras PPSH e bazucas (RPG-2). Existiam destacamentos femininos que não entravam em combate. As Forças Armadas Locais combatiam ocasionalmente ao lado do exército. Desempenhavam essencialmente missões de segurança, aliadas ao trabalho político. Colaboravam com as populações nos trabalhos agrícolas e na reconstrução das estruturas destruídas pelo fogo inimigo.
Entre 1972 e 1974, os serviços de informação de Lisboa estimavam em cerca de 7.500 os combatentes que enfrentavam na Guiné. Pouco mais de 5.000 integrariam o exército popular, enquanto outros 2.000 fariam parte das forças armadas locais.
Haveria 2.800 homens a combater na chamada Inter-Região Norte e 2.500 na Inter-Região Sul. O maior contingente (1.230 homens) enfrentava as forças portuguesas na zona Buba/Quitafine.
As dificuldades de comunicação entre as várias chefias militares e entre elas e a direção do partido, sediada em Conakry, repetiram-se ao longo da luta armada. Foi preocupação constante de Amílcar Cabral subordinar os militares aos políticos. Não foi tarefa fácil.
Havia mais problemas. O cansaço de guerra atingiu muitos combatentes. O PAIGC chamava os jovens ao combate apelando ao dever cívico e patriótico. Os guerrilheiros não eram pagos nem tinham um tempo de serviço contratado. Viviam com dificuldades e alimentavam-se mal.
A colocação dos militares em áreas distantes das suas moranças originava dificuldades de adaptação. “No Gabu, mais de 40% dos efetivos abandonaram as suas unidades, saindo à procura do caminho para regressar às suas casas”. Os dirigentes do PAIGC procuraram contornar este problema passando a distribuir preferencialmente os combatentes pelas suas regiões de origem.
Embora, numa guerra de guerrilha, o número de soldados revolucionários, distribuídos por unidades de grande mobilidade, seja sempre muitas vezes inferior ao número de efetivos dos exércitos regulares, que combatem mais fixados a posições defensivas, nem sempre o recrutamento de voluntários para o PAIGC correspondeu às expectativas dos seus dirigentes.   

    


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