DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sábado, 13 de abril de 2013


          AMÍLCAR CABRAL


                      V

POR TRÁS DOS ASSASSINOS

Amílcar Cabral escreveu, alguns anos antes da sua morte: se um dia for assassinado, sê-lo-ei, provavelmente, por um homem do meu povo, do partido e talvez mesmo da primeira hora. 
Acertou. Todos os que participaram diretamente no assassinato de Amílcar Cabral eram membros do PAIGC. Mamamou Djai era mesmo o responsável pela sua segurança.
Os assassinos (Inocêncio Cani, Mamou Touré, Bacar Cani, Aristides Barbosa, Mamadou N`Djai e outros) eram membros guineenses do PAIGC. Pretenderiam afastar da direção do partido os cabo-verdianos e “brumedjos” (mulatos guineenses).
        Alguns revoltosos confessaram espontaneamente o crime e outros fizeram-no sob tortura. Entregues à justiça do Partido, foram rapidamente fuzilados.  
        Há quem pense que houve demasiada pressa na aplicação da justiça. A maioria dos revoltosos pertencia à Marinha do partido. Muitos haviam frequentado ações de formação na União Soviética e alguns tinham grandes ambições de progredir na hierarquia do PAIGC. Todos os cabecilhas do assassínio de Amílcar Cabral estiveram presos juntos na cadeia do PAIGC, “A Montanha”, entre abril e setembro de 1971.             
 Os conjurados estavam descontentes com a direção do partido, ou por divergências relativas à projetada união entre a Guiné e Cabo Verde, ou pela aplicação de castigos disciplinares e de penas de prisão. Alegadamente, Amílcar Cabral protegeria os cabo-verdianos, por quem distribuiria cargos políticos enquanto enviava os filhos da Guiné para a frente de combate.
Segundo Fernando Baginha, “havia desentendimentos por vezes violentos entre Cabral e Osvaldo Vieira, devido a problemas de condução militar das operações. Os «homens do mato» eram os executores da guerra e Cabral permitia-se, por vezes depois de longas ausências no estrangeiro, alterar completamente planos já estabelecidos. Para mais, Cabral já não entrava nas zonas libertadas da Guiné-Bissau havia cerca de três anos.”
         A 20 de Janeiro de 1973, Osvaldo Vieira estava em Conakry. Terá assistido a tudo, sem nada fazer para evitar a tragédia. Foi levado, sob prisão, para Madina do Boé. Algum tempo mais tarde, foi veiculada a informação de que teria sucumbido a um problema gástrico. Terá sido executado. Não integrou a lista dos culpados oficiais pela morte do líder histórico do PAIGC, de que constavam apenas cinco nomes.
        Sekou Touré não autorizou fuzilamentos dentro do território da República da Guiné. Os implicados no golpe foram levados para o interior da Guiné-Bissau. Após o inquérito do PAIGC, foram executados cerca de 100 presumíveis implicados no golpe. Osvaldo Vieira foi um deles. 
Conhecem-se as mãos criminosas. Quem as terá ajudado, se é que foi precisa ajuda?
        Quem investiga uma morte, começa habitualmente por identificar as pessoas ou organizações a quem ela convém. O desaparecimento de Amílcar Cabral interessava a muita gente. Em primeiro lugar, ao governo português, que pretendia evitar a todo o custo a proclamação unilateral de independência da Guiné. Bem tentou. Foi esse um dos objetivos da “Operação Mar Verde”, em novembro de 1970 e da “Operação Amílcar Cabral”, no ano seguinte. Não terão existido condições para novas tentativas.
 No Portugal daquele tempo, atribuía-se à PIDE tudo o que de mau acontecia no país. A verdade é que a PIDE/ DGS detinha menos poder do que se supunha. A probabilidade de elementos da PIDE terem estabelecido contactos com elementos do PAIGC que queriam ver os cabo-verdianos fora da Guiné é elevada, mas não existem provas de que tenham participado na conjura. 
        Os opositores de Sekou Touré procuraram associá-lo ao atentado. Esta tese agradava sobretudo aos portugueses, a quem convinha afastar a PIDE e Spínola do rol dos suspeitos. Os argumentos eram de dois tipos. Em primeiro lugar, Touré já não tinha o prestígio dos primeiros anos da sua governação e o crescente protagonismo internacional de Amílcar Cabral incomodá-lo-ia. Em segundo lugar, o Presidente sonharia com uma Grande Guiné, que resultaria da anexação da Guiné então portuguesa.  Os obstáculos maiores a essa ambição seriam, no imediato, as forças armadas portuguesas e, mais tarde, a união da Guiné-Bissau com Cabo Verde sob a liderança de Amílcar Cabral.  
        O facto de ter recebido os cabecilhas da conspiração antes do corpo de Amílcar Cabral arrefecer fez aumentar as suspeitas. Há quem afirme que dois oficiais do exército guineense terão garantido aos conjurados o apoio ou, pelo menos, a neutralidade do Presidente. Os discursos ambíguos de Touré logo a seguir à morte de Amílcar Cabral e por altura do seu funeral não contribuíram para clarificar a situação. 
        No dia seguinte ao assassinato, Sekou Touré fez uma declaração através da rádio oficial da Guiné e atribuiu o atentado a militares africanos do exército português infiltrados nas fileiras do PAIGC.  Alguns dias mais tarde, Luís Cabral voltou a acusar infiltrados e apontou também o dedo a desertores. As palavras de ambos foram ecoadas pela imprensa anticolonialista. O único jornalista estrangeiro a ter acesso aos inquéritos foi o moçambicano Aquino de Bragança, da revista Afrique/Asie.Acusou a PIDE de estar por trás das mãos criminosas mas não apresentou factos nem argumentos credíveis para sustentar a sua hipótese.
        Criaram-se três comissões de inquérito para identificar os eventuais autores morais do crime. Uma ficou a cargo do PAIGC, outra do governo da Guiné-Conakri e a última de organizações internacionais, com a participação de Samora Machel. Nenhuma delas divulgou relatórios. A questão continua por esclarecer.

     O partido parece ter estado pouco interessado em fazer perguntas. Dava jeito ao PAIGC passar a ideia de que o seu líder histórico tinha sido eliminado a mando do inimigo externo. Fuzilou os conspiradores, uniu fileiras atrás da memória do chefe e festejou o fim da supremacia aérea portuguesa, obtida pelos mísseis soviéticos Strella que deitaram abaixo vários aviões e helicópteros portuguesas e desmoralizaram os combatentes coloniais. A negociação com os soviéticos para a cedência dos mísseis terra-ar fora uma das últimas missões bem-sucedidas de Amílcar Cabral.
Amílcar Cabral escreveu, alguns anos antes da sua morte: se um dia for assassinado, sê-lo-ei, provavelmente, por um homem do meu povo, do partido e talvez mesmo da primeira hora. Acertou. Todos os que participaram diretamente no assassinato de Amílcar Cabral eram membros do PAIGC. Alguns confessaram espontaneamente o crime e outros fizeram-no sob tortura. Entregues à justiça do Partido, foram rapidamente fuzilados.
Há quem pense que houve demasiada pressa na aplicação da justiça. A maioria dos revoltosos pertencia à Marinha do partido. Muitos haviam frequentado ações de formação na União Soviética e alguns tinham grandes ambições de progredir na hierarquia do PAIGC. Os conjurados estavam descontentes com a direção do partido, ou por divergências relativas à projetada união entre a Guiné e Cabo Verde, ou pela aplicação de castigos disciplinares e até de penas de prisão. Segundo alguns, Amílcar Cabral protegia os cabo-verdianos, por quem distribuía cargos políticos enquanto enviava os filhos da Guiné para a frente de combate.
Criaram-se três comissões de inquérito para identificar os eventuais autores morais do crime. Uma ficou a cargo do PAIGC, outra do governo da Guiné-Conakri e a última de organizações internacionais. Nenhuma delas divulgou relatórios. A questão continua por esclarecer.
Quem investiga uma morte, começa habitualmente por identificar as pessoas ou organizações a quem ela convém. O desaparecimento de Amílcar Cabral interessava a muita gente. Em primeiro lugar, ao governo português, que pretendia evitar a todo o custo a proclamação unilateral de independência da Guiné. Bem tentou. Foi esse um dos objetivos da “Operação Mar Verde”, em novembro de 1970 e da “Operação Amílcar Cabral”, no ano seguinte. Não terão existido condições para novas tentativas. A probabilidade de a PIDE ter estabelecido contactos com elementos do PAIGC que queriam ver os cabo-verdianos fora da Guiné é elevada, mas não existem provas de que tenha participado na conjura. 
Os opositores de Sekou Touré procuraram associá-lo ao atentado. Esta tese agradava sobretudo aos portugueses, a quem convinha afastar a PIDE e Spínola do rol dos suspeitos. Os argumentos eram de dois tipos. Em primeiro lugar, Touré já não tinha o prestígio dos primeiros anos da sua governação e o crescente protagonismo internacional de Amílcar Cabral incomodá-lo-ia. Em segundo lugar, o Presidente sonharia com uma Grande Guiné, que resultaria da anexação da Guiné então portuguesa.  Os obstáculos maiores a essa ambição seriam, no imediato, as forças armadas portuguesas e, mais tarde, a união da Guiné-Bissau com Cabo Verde sob a liderança de Amílcar Cabral.  
O facto de ter recebido os cabecilhas da conspiração antes do corpo de Amílcar Cabral arrefecer fez aumentar as suspeitas. Há quem afirme que dois oficiais do exército guineense terão garantido aos conjurados o apoio ou, pelo menos, a neutralidade do Presidente. Os discursos ambíguos de Touré logo a seguir à morte de Amílcar Cabral e por altura do seu funeral não contribuíram para clarificar a situação. 
No dia seguinte ao assassinato, Sekou Touré fez uma declaração através da rádio oficial da Guiné e atribuiu o atentado a militares africanos do exército português infiltrados nas fileiras do PAIGC.  Alguns dias mais tarde, Luís Cabral voltou a acusar infiltrados e apontou também o dedo a desertores. As palavras de ambos foram ecoadas pela imprensa anticolonialista. O único jornalista estrangeiro a ter acesso aos inquéritos foi o moçambicano Aquino de Bragança, da revista Afrique/Asie. Acusou a PIDE de estar por trás das mãos criminosas mas não apresentou factos nem argumentos credíveis para sustentar a sua hipótese.
O partido parece ter estado pouco interessado em fazer perguntas. Dava jeito ao PAIGC passar a ideia de que o seu líder histórico tinha sido eliminado a mando do inimigo externo. Fuzilou os conspiradores, uniu fileiras atrás da memória do chefe e festejou o fim da supremacia aérea portuguesa, obtida pelos mísseis soviéticos Stinger que deitaram abaixo vários aviões e helicópteros portuguesas e desmoralizaram os combatentes coloniais. A negociação com os soviéticos para a cedência dos mísseis terra-ar fora uma das últimas missões bem-sucedidas de Amílcar Cabral.
Estranhamente, no meu modo de ver, os desentendimentos entre cabo-verdianos e guineenses levaram algum tempo a explodir. Foi apenas em 1980 que Nino Vieira levou a cabo um golpe de estado que afastou da presidência da Guiné-Bissau Luís Cabral, irmão de Amílcar, substituindo o sonho de uma união utópica de duas antigas colónias de características diferentes e até antagónicas pela realidade de dois estados independentes. 

Amílcar Cabral escreveu, alguns anos antes da sua morte: se um dia for assassinado, sê-lo-ei, provavelmente, por um homem do meu povo, do partido e talvez mesmo da primeira hora. Acertou. Todos os que participaram diretamente no assassinato de Amílcar Cabral eram membros do PAIGC. Alguns confessaram espontaneamente o crime e outros fizeram-no sob tortura. Entregues à justiça do Partido, foram rapidamente fuzilados.
Há quem pense que houve demasiada pressa na aplicação da justiça. A maioria dos revoltosos pertencia à Marinha do partido. Muitos haviam frequentado ações de formação na União Soviética e alguns tinham grandes ambições de progredir na hierarquia do PAIGC. Os conjurados estavam descontentes com a direção do partido, ou por divergências relativas à projetada união entre a Guiné e Cabo Verde, ou pela aplicação de castigos disciplinares e até de penas de prisão. Segundo alguns, Amílcar Cabral protegia os cabo-verdianos, por quem distribuía cargos políticos enquanto enviava os filhos da Guiné para a frente de combate.
Criaram-se três comissões de inquérito para identificar os eventuais autores morais do crime. Uma ficou a cargo do PAIGC, outra do governo da Guiné-Conakri e a última de organizações internacionais. Nenhuma delas divulgou relatórios. A questão continua por esclarecer.
Quem investiga uma morte, começa habitualmente por identificar as pessoas ou organizações a quem ela convém. O desaparecimento de Amílcar Cabral interessava a muita gente. Em primeiro lugar, ao governo português, que pretendia evitar a todo o custo a proclamação unilateral de independência da Guiné. Bem tentou. Foi esse um dos objetivos da “Operação Mar Verde”, em novembro de 1970 e da “Operação Amílcar Cabral”, no ano seguinte. Não terão existido condições para novas tentativas. A probabilidade de a PIDE ter estabelecido contactos com elementos do PAIGC que queriam ver os cabo-verdianos fora da Guiné é elevada, mas não existem provas de que tenha participado na conjura. 
Os opositores de Sekou Touré procuraram associá-lo ao atentado. Esta tese agradava sobretudo aos portugueses, a quem convinha afastar a PIDE e Spínola do rol dos suspeitos. Os argumentos eram de dois tipos. Em primeiro lugar, Touré já não tinha o prestígio dos primeiros anos da sua governação e o crescente protagonismo internacional de Amílcar Cabral incomodá-lo-ia. Em segundo lugar, o Presidente sonharia com uma Grande Guiné, que resultaria da anexação da Guiné então portuguesa.  Os obstáculos maiores a essa ambição seriam, no imediato, as forças armadas portuguesas e, mais tarde, a união da Guiné-Bissau com Cabo Verde sob a liderança de Amílcar Cabral.  
O facto de ter recebido os cabecilhas da conspiração antes do corpo de Amílcar Cabral arrefecer fez aumentar as suspeitas. Há quem afirme que dois oficiais do exército guineense terão garantido aos conjurados o apoio ou, pelo menos, a neutralidade do Presidente. Os discursos ambíguos de Touré logo a seguir à morte de Amílcar Cabral e por altura do seu funeral não contribuíram para clarificar a situação. 
No dia seguinte ao assassinato, Sekou Touré fez uma declaração através da rádio oficial da Guiné e atribuiu o atentado a militares africanos do exército português infiltrados nas fileiras do PAIGC.  Alguns dias mais tarde, Luís Cabral voltou a acusar infiltrados e apontou também o dedo a desertores. As palavras de ambos foram ecoadas pela imprensa anticolonialista. O único jornalista estrangeiro a ter acesso aos inquéritos foi o moçambicano Aquino de Bragança, da revista Afrique/Asie. Acusou a PIDE de estar por trás das mãos criminosas mas não apresentou factos nem argumentos credíveis para sustentar a sua hipótese.
O partido parece ter estado pouco interessado em fazer perguntas. Dava jeito ao PAIGC passar a ideia de que o seu líder histórico tinha sido eliminado a mando do inimigo externo. Fuzilou os conspiradores, uniu fileiras atrás da memória do chefe e festejou o fim da supremacia aérea portuguesa, obtida pelos mísseis soviéticos Strella que deitaram abaixo vários aviões e helicópteros portuguesas e desmoralizaram os combatentes coloniais. A negociação com os soviéticos para a cedência dos mísseis terra-ar fora uma das últimas missões bem-sucedidas de Amílcar Cabral.
Estranhamente, no meu modo de ver, os desentendimentos entre cabo-verdianos e guineenses levaram algum tempo a explodir. Foi apenas em 1980 que Nino Vieira levou a cabo um golpe de estado que afastou da presidência da Guiné-Bissau Luís Cabral, irmão de Amílcar, substituindo o sonho de uma união utópica de duas antigas colónias de características diferentes e até antagónicas pela realidade de dois estados independentes. 

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