O CAMINHO BRANCO
Poucas lembranças conservo
dos tempos de meninice que passei em Foz Coa. Terá sido entre os dois e os quatro
anos, ou pouco mais. Recordo vagamente a lagoa, que me parecia enorme, e
lembro-me de usar calções com racha atrás, como os outros rapazitos. Eram especialmente
úteis no tempo frio…
Sei, de ouvir dizer, que
morávamos na Rua de S. Miguel. no prédio onde fica hoje a Terrinca. Contaram-me
as minhas irmãs que, quando se varria a lareira, aparecia uma inscrição onde se
lia “Aqui jaz”. A mentalidade pragmática dos humanos levava-os a reciclar
qualquer material que fosse útil à construção.
Colaram-se-me ao espírito
outras memórias, nascidas de narrações repetidas. Uma delas foi a lenda do
Caminho Branco, onde dançariam as bruxas nas noites de terça e sexta-feira.
Não sou crente, o que me
torna mais vulnerável à fantasia.
Há três dias, regressei a
Foz Coa e perguntei pelo Caminho Branco a dois homens de meia-idade que
conversavam à sombra, sentados num banco de pedra.
A resposta foi pronta:
− Fica perto. Vai por
aquela rua (apontou-ma). Vira duas vezes à direita e uma à esquerda e já lá
está.
Segui as instruções e
encontrei-me no começo duma calçada larga, muito limpa, delimitada por muros de
xisto que abrigavam prédios com olivais. Avistavam-se ao fundo casas novas.
Perguntei a uma moça
jeitosa que passava por ali, de telemóvel na mão:
− Menina! É este o Caminho
Branco?
A moça sorriu, admirada
talvez pela minha ignorância.
− É sim. Vai dar às
piscinas.
Guardou o sorriso e
prosseguiu o caminho e a teleconversa.
Olhei em volta, um pouco a
medo, mas não avistei bruxas, nem sinais delas. Na verdade, não era terça-feira
e a meia-noite estava longe.
Voltei para o carro e
conduzi em direção a Almendra, com a imaginação a baralhar-me os sentidos. E se
aquela rapariga fosse bruxa e se juntasse ás outras nas terças-feiras à noite,
para dançar nua no Caminho Branco?
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