DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014






   A HISTÓRIA PERTO DE NÓS      


       LEMBRANDO AMÍLCAR E LUÍS CABRAL


               NOTAS RETIRADAS DA CONVERSA COM JUVELINA ROCHA, 
                        IRMÃ DE LUÍS E MEIA-IRMÃ DE AMÍLCAR, 
                        E COM O SEU MARIDO ANTÓNIO ROCHA

                                                 III

Quando Nino Vieira apeou Luís Cabral da Presidência da República, Juvelina encontrava-se em S. Paulo, no Brasil, integrada na Delegação da Guiné-Bissau ao 1º Simposium Afro-Brasileiro de Comércio Externo. Logo que a notícia da deposição e prisão do seu irmão Luís chegou, a postura de um dos elementos da delegação modificou-se radicalmente, passando das mesuras da véspera à falta de respeito.



Juvelina achou prudente não regressar a Bissau. Viajou para Lisboa, onde tinha casa, e ficou a aguardar o desenvolvimento da situação.  O marido e o filho mais velho permaneceram na Guiné, enquanto o mais novo estudava em Portugal. 
     O marido, Abel Ventura, regressou três anos mais tarde. Gerira mal o património, deixando a família em situação económica periclitante.



Quando foi posto em liberdade, Luís Cabral acolheu-se em Cuba, onde viveu de 1981 a 1983. Tentou regressar a Cabo Verde, mas as várias cartas que escreveu a Aristides Pereira a manifestar essa intenção ficaram sem resposta. O governo português, com o apoio do Presidente Ramalho Eanes, ofereceu-lhe asilo político em Lisboa.



Juvelina ainda pensou em regressar a Cabo Verde, onde nascera e vivera os primeiros quinze anos da sua vida. Aristides Pereira, o presidente da República, não a quis de volta. Argumentou que ela não tinha família em Cabo Verde. Aristides era um homem cauteloso. Recearia a sombra do prestígio aliado ao nome “Cabral”.



Luís Cabral chegou a Portugal no início de 1984. A princípio, instalou-se com a mulher e os filhos em casa da irmã.
No ano seguinte, pressionada pelas dificuldades financeiras, Juvelina Cabral voltou à Guiné. Pretendia reaver os seus bens e renegociar o aluguer do prédio da família onde se instalara a Embaixada da China, pagando uma renda que seria vinte vezes inferior ao valor de mercado.  Foi ali que conheceu o que viria a ser o seu segundo marido.



António Rocha é licenciado em Economia pela Universidade do Porto. Ainda adolescente, atreveu-se a emigrar sozinho para Moçambique, onde trabalhou. Voltou três anos depois e retomou os estudos. Ingressou na SACOR (depois PETROGAL) a meio do curso. Em 1985, foi contratado como assessor da Direção Geral da DICOL, empresa monopolista de combustíveis da Guiné-Bissau, então dirigida pelo futuro primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior.
Waldemar Oliveira, ligado às empresas de petróleo em Portugal e na Guiné e casado com Armanda Cabral, constituiu o elo entre António e Juvelina. António passou a estar presente em todos os eventos da família Cabral. Ele e Juvelina acabaram por se apaixonar. Trataram dos divórcios e, em junho de 1990, formalizaram o casamento na Embaixada de Portugal em Bissau.
António Rocha deixou de vez a PETROGAL e passou a trabalhar para organismos internacionais que prestavam ajuda à Guiné. Em 1996, o casal vivia de novo em Bissau. Tornaram-se ambos sócios duma empresa agrícola que acabaram por deter na totalidade, e geriram um restaurante e uma piscina.
Curiosamente, Nino Vieira respeitava a irmã de Luís Cabral e parecia estimá-la. O casal vivia bem. António chegou a ser Assessor Económico da Presidência da República (na dependência direta do Ministro de Estado da Presidência, Fidelis Cabral de Almada) e, durante dois mandatos, Presidente da Escola Portuguesa em Bissau.
Luís Cabral, após a queda de Nino Vieira, ainda esteve na Guiné por um curto período de tempo.
A Guiné-Bissau era um país instável e, a dada altura, o Dr. António Rocha passou a ser mal visto pelos responsáveis pelo poder político.
 Em 2010, mudou-se para Angola, onde trabalhou como consultor e assessor do Governo da Província de Luanda. O casal vive agora em Nova Oeiras.



Luís Cabral o primeiro Presidente da República da Guiné-Bissau, morreu em Torres Vedras, em maio de 2009. Repousa no cemitério do Alto de S. João, em Lisboa. Teria preferido descansar em África.



Ana Maria Cabral, a viúva de Amílcar, vive em Cabo Verde.
Iva, a filha mais velha de Amílcar Cabral e de Maria Helena, nascida na Guiné, é hoje reitora da Universidade Lusófona de Cabo Verde, em S. Vicente.




Amílcar e o seu irmão Luís, tanto quanto sei, sempre se deram bem. Curiosamente, não fui capaz de encontrar uma fotografia em que figurassem juntos.


FOTOGRAFIAS: JUVELINA ROCHA, INTERNET.

AGRADECIMENTOS: A JUVELINA E ANTÓNIO ROCHA, PELA GENTILEZA COM QUE SE DISPUSERAM A PARTILHAR AS SUAS MEMÓRIAS.



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