DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

quarta-feira, 26 de abril de 2017


 BANDOLEIROS EM PORTUGAL

NA PRIMEIRA METADE 

DO SÉCULO XIX

     João Brandão

O fenómeno das guerrilhas nasceu em Portugal, no começo do século XIX, como reação patriótica contra as invasões francesas.
Mais tarde, a instabilidade política e social em que o país mergulhou, com as lutas prolongadas entre liberais e absolutistas, com revoltas e golpes de estado sucessivos, enfraqueceu a autoridade pública e permitiu que proliferasse o banditismo. Com as quadrilhas engrossadas por desertores, as populações viviam alarmadas.
Durante esse período conturbado em que a lei não chegava a toda a parte, aconteceu algumas vezes que as forças políticas e militares que se defrontavam aceitassem a aliança de grupos de bandoleiros. Por outro lado, certos chefes de guerrilha resvalaram para atividades criminosas.
Tempos de exceção são fábricas de lendas. Irei falar de alguns personagens que se notabilizaram na época, nem sempre pelas melhores razões.

                                                      Remexido
José Joaquim de Sousa Reis, o Remexido, miguelista, era de Lagoa e atuava no Algarve.
José do Telhado terá posto a sua quadrilha ao lado dos setembristas, durante a guerra civil de 1846-1847.
João Brandão, de Midões, espalhou o terror nas Beiras, ao serviço dos Cabrais. Com a Regeneração, passou a “influente” político local, aliando-se umas vezes ao governo e outras à oposição.
Os Marçais de Foz Coa, cartistas, desestabilizaram a região durante dezenas de anos.
Curiosamente, tanto o Zé do Telhado como o João Brandão e o António Marçal receberam altas condecorações militares. O Remexido, tanto quanto sei, não foi condecorado, mas foi nomeado, por D. Miguel, governador do Algarve.


A questão das guerrilhas e do banditismo tem sido teorizada.
Hobsbawm, citado por Célia Taborda da Silva, define aquele a quem chama “bandido social”: «é um camponês fora da lei que o senhor e o Estado consideram como um criminoso, mas que permanece no seio da sociedade camponesa, a qual vê nele um herói, um campeão, um vingador, um justiceiro, talvez mesmo um libertador e, em qualquer caso, um homem que convém admirar, ajudar e manter». O bandido seria “a ponta da lança” do protesto das massas rurais contra as estruturas sociais opressoras.
É impossível não lembrar, nesta altura, os textos de Mao Tse Tung e de Che Guevara.
Hobsbawm vai mais longe e divide os bandidos em três tipos:
«Bandido Generoso», que só mata em legítima defesa e rouba os ricos para dar aos pobres.
«Vingador», bandido cruel, temido e ao mesmo tempo admirado pela população.
 «Haiducs», específicos dos Balcãs, bandidos que atacam os opressores da comunidade.
 Nesta classificação, em Portugal, o único dos bandoleiros famosos a que se pode chamar “generoso” é o Zé do Telhado.  

Fonte: 
Taborda Silva, Célia. Guerrilheiros e bandidos no Douro na primeira metade do século XIX. Douro – Estudos & Documentos, vol. I (3), 1997 (2º), 111-122.

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