OS POETAS E OS DEUSES
Os deuses não parecem gostar dos poetas.
Não será bem assim. Talvez se virem mais para a Poesia aqueles que se sentem frias as miradas vindas do Olimpo.
Olhamos brevemente para três dos nossos vates maiores.
Camões dedicou versos lindíssimos a muitas mulheres. Morreu solteiro e sem filhos. Era fidalgo, mas pobre. Pouco sabemos do seu temperamento. A “Natércia” ignorou-o. Outras a terão imitado.
No Oriente, para onde navegou em busca da Fortuna, as mulheres portuguesas eram enfeitadas com a mais-valia da escassez. Nenhuma delas baixaria o olhar para um soldado zarolho. Poucas saberiam ler e raras seriam as dotadas de paciência suficiente para ouvir uma sucessão longa de versos.
O talento de Luís de Camões transformou a desdita em benção. “Alma minha gentil que te partiste” contém a cacofonia mais bonita da língua portuguesa e “Endechas a Bárbara Escrava” é um dos poemas mais belos que algum europeu, em todos os tempos, dedicou a mulheres de raças então consideradas inferiores.
Houve muitos poetas que não alcançaram em vida o reconhecimento que mereciam. Foi o que aconteceu com Bocage.
Ao regressar a Portugal, após uma ausência de quatro anos no Oriente, Elmano deu com a sua “Gertrúria” casada com o seu irmão Gil. Gil, o mais velho, beneficiara do estatuto de “morgado”. Pôde fazer-se bacharel em Coimbra e herdou a fatia mais grossa do património familiar. O segundo filho estaria destinado a seguir a carreira das armas e o terceiro, a existir, seria empurrado para os braços da igreja.
Fernando Pessoa também teve uma vida triste.
O poeta cabalista seria bissexual, com a tendência “gay” mais desenvolvida. Terá namorado com Ofélia Queirós, a quem escreveu 48 cartas, mas quem leu o “Antinous” ficará com poucas dúvidas sobre a sua orientação sexual dominante.
Julgo que, ainda hoje, boa parte dos homossexuais será (pelo menos estatisticamente) mais infeliz que os de sexualidade convencional. Os preconceitos levam dezenas ou centenas de anos a esbater-se. Estou, no entanto, em crer que a homossexualidade é uma criação da Natureza, projetada para diluir a tensão em lugares ou situações em que se acumulam num espaço limitado demasiados seres do mesmo sexo. Diz-se que tal acontece também com animais, incluindo os leões.
Na história de Portugal, as aglomerações demoradas de indivíduos do mesmo sexo ocorreram principalmente em conventos e navios.
Estamos habituados a glorificar a Expansão Ultramarina, que dispersou a língua portuguesa pelas sete partidas do mundo. Quantos dos nossos bravos marinheiros seriam “gays”?