AMÍLCAR CABRAL
XXX
AS ORIGENS. A INFÂNCIA NA GUINÉ
Amílcar
Cabral nasceu em Bafatá, na colónia portuguesa da Guiné, a 12 de Setembro de
1924. Era filho de Juvenal António Lopes da Costa (Cabral) e de Iva Pinhel
Évora. No registo de nascimento está escrito Hamílcar. O pai conhecia e
apreciava os clássicos. Seria admirador dos generais cartagineses.
Juvenal Cabral ficou órfão muito cedo. O
avô de Amílcar terá sido assassinado. Juvenal acompanhou a madrinha Simoa quando
ela se mudou para Portugal e viveu em Santiago de Cassuarães, na Beira Alta,
durante alguns anos. Estudou no seminário de Viseu. Por dificuldades
económicas, regressou a Cabo Verde em 1905, com dezassete anos. Em 1911, com 23
anos, emigrou para a Guiné, à procura de trabalho.
Iva Pinhel Évora mudou-se para a Guiné em
1922, com 29 anos de idade. Viajou acompanhada do filho de 9 meses, Ivo
Carvalho Silva, e do pai dele, João Carvalho Silva.
A relação dos pais de Amílcar não foi
exclusiva nem duradoura. Juvenal foi um povoador. Teve numerosos filhos
(provavelmente mais de onze) de Ernestina Soares de Andrade, três de Iva Pinhel
Évora e pelo menos um (Luís Cabral) da única mulher com quem casou
oficialmente, Adelina Rodrigues Correia.
Juvenal Cabral foi professor sem
habilitações e funcionário administrativo adaptado. Para sustentar a família, deu
aulas em Geba e noutras localidades e exerceu as funções de “subdelegado do
Procurador da República e Procurador Judicial autorizado pelo Governador”, o
que equivaleria mais ao menos ao papel de solicitador, tendo chegado a publicitar
no Boletim Oficial da Guiné a sua disponibilidade para receber procurações para
representar e defender as partes nos processos que corriam na Circunscrição de
Bafatá. Paralelamente, seria proprietário de uma loja em Geba, a qual estaria
em nome de Ernestina.
Ensinando em Geba, deslocava-se com
frequência a Bafatá para tratar de processos e fiscalizar o negócio. Aí
conheceu Iva Pinhel, em 1922 ou em 1923. Terá aberto outra loja em nome dela.
Juvenal Cabral tinha ideias próprias e
gostava de escrever. Publicou diversos artigos e um livro intitulado «Memórias
e reflexões». As suas opiniões políticas eram muito diferentes das que haveriam
de ser assumidas anos mais tarde pelo filho Amílcar. Juvenal não se opunha ao
Estado Novo salazarista. Criticava o sistema agrícola das ilhas e defendia reformas
em Cabo Verde e na Guiné, mas dentro de um contexto de Portugalidade. Num
artigo saído no jornal «A Voz de Cabo Verde» homenageou a intervenção do
“herói” português Teixeira Pinto na guerra contra os papéis de Bissau, o que
provocou em Bolama a ira dos elementos da Liga Guineense.
Juvenal passou alguns meses em Cabo Verde
em 1926. Viajou com Ernestina e todos os filhos dela. Julga-se que a viagem
visava encerrar a ligação de ambos. De regresso à Guiné, Juvenal terá passado a
estar mais tempo com Iva, de quem teve, em 1927, duas filhas gémeas, Armanda e
Arminda.
Amílcar Cabral viveu na Guiné do nascimento
até aos oito anos. Terá estado com a mãe em Bafatá de 1924 a 1927, enquanto o
pai morava em Geba, e mais tarde em Geba, de 1927 a 1929, supostamente com a
mãe e com o pai. Passou depois cerca de um ano em Cabo Verde, na companhia da
mãe e das irmãs. Há documentos que demonstram que esteve na cidade da Praia em
1929. O pai e a mãe, nessa data, já se teriam separado. Juvenal Cabral casou com
Adelina Rodrigues Correia em fevereiro de 1930.
Amílcar voltou à Guiné com o pai e dois
irmãos, enquanto a mãe permanecia em Cabo Verde. Iva não foi capaz de se manter
na terra natal. Por “dificuldades de adaptação”, regressou à Guiné em 30 ou 31.
Segundo Luís Cabral, partilhou a casa em Bissau com Juvenal e a sua nova
família.
Os tempos de Bissau (um ou dois anos)
foram difíceis. O miúdo Amílcar vendia numa taberna coisas que a mãe fazia.
Amílcar Cabral parece ter guardado
poucas memórias da infância passada na Guiné natal. Pelo menos, nunca escreveu
sobre ela.
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