DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

  
                      AMÍLCAR CABRAL

                               XLIV

          OS CAMINHOS DO MUNDO                       

Em 1959, Agostinho Neto estava a terminar, em Lisboa, o curso de Medicina. Mário de Andrade, Lúcio Lara, Viriato da Cruz, Azancourt de Menezes e outros, tinham abandonado já o território português para se dedicarem a tempo inteiro às causas das independências dos seus países, Amílcar Cabral decidiu finalmente deixar a capital portuguesa. Ainda assim, foi adiando a saída definitiva.
Durante o ano de 59, Cabral viajou muito. Em abril, encontrou-se em Frankfurt com Lúcio Lara e Viriato da Cruz. De passagem por Paris, conferenciou com Marcelino dos Santos e Guilherme do Espírito Santo, sobre a necessidade de avançar com medidas concretas contra o colonialismo português.
O Movimento Unitário Anticolonial (MAC), fundado em 1958, procurava alargar o seu raio de ação. Cedo, porém, nasceram divergências no seu interior. Era tempo de se criarem, em cada colónia, movimentos de cariz nacional. Ao MAC caberia, quanto muito, um papel de coordenação.
Em agosto, Amílcar Cabral deslocou-se a Luanda com o objetivo de comunicar às organizações clandestinas angolanas a oferta argelina para preparar militarmente um pequeno grupo de militantes. A PIDE desencadeara uma vaga de prisões e Cabral ficou sem interlocutores.
No caminho de regresso, visitou os dois Congos, o Ghana, o Senegal e a República da Guiné-Conakry. O massacre de Pindjiguiti ocorreu no começo de agosto. Em setembro, Cabral regressou a Bissau e contactou a o Movimento de Libertação da Guiné (MLG), única organização nacionalista a funcionar então na colónia. A integração progressiva de cabo-verdianos nesse movimento possibilitou a sua evolução para um projeto federalista, com a consequente mudança de nome. Passou a chamar-se MLGC.
O PAI (depois PAIGC) nasceria de facto em Bissau, num fim de semana de setembro de 1959. Muitos dos seus elementos militavam, até então, no MLGC.
O PAI começou por ser um partido de fundadores. Cabral acreditava na necessidade de criar uma organização clandestina pequena e coesa, imune tanto quanto possível à admissão de gente mal preparada e de possíveis traidores. O MGL não se extinguiu logo. Foram militantes seus que facilitaram a instalação de Amílcar Cabral em Conakry, em maio de 1960. Seguiu-se a criação da Frente de Libertação da Guiné e Cabo Verde (FLGC), destinada a unificar os movimentos nacionalistas da Guiné. A Frente constituiu um recurso temporário. Acabaria por ser dissolvida. O objetivo de Cabral era a união dos revolucionários da Guiné e de Cabo Verde numa única instituição com um programa claro, capaz de prosseguir melhor os objetivos comuns.
Em janeiro de 1960, Amílcar Cabral deixou Lisboa de vez. Encontrou-se em Paris com Mário de Andrade, Viriato da Cruz e Marcelino dos Santos.
Ainda nesse mês, participou na II Conferência dos Povos Africanos, em Tunes. Foi como delegado do MAC, mas aproveitou a reunião com os outros delegados das colónias portuguesas, entre os quais se contavam Holden Roberto (que nunca teve a simpatia de Cabral), Lúcio Lara, Hugo Menezes  e Viriato da Cruz, para fundar a Frente Revolucionária Africana para a Independência Nacional das Colónias Portuguesas (FRAIN), que substituía o MAC e dava voz, no estrangeiro, à luta dos povos sob o domínio de Lisboa. Apareceram então, pela primeira vez, documentos com as siglas PAI e MPLA. O protagonismo dos movimentos de independência nacional ia começar.
A Conferência permitiu aos líderes nacionalistas de Angola e da Guiné conhecer outros dirigentes africanos e contactar organizações internacionais associadas à União Soviética, à China e aos EUA. Tornava-se claro que a libertação das colónias ia depender essencialmente da diplomacia.
Em Março do mesmo ano, na qualidade de presidente da FRAIN, Cabral fez a primeira conferência pública de um dirigente revolucionário das colónias portuguesas.
Conheceu então o escritor e jornalista inglês Basil Davidson que, juntamente João Carcíolo Cabral, da Goan League, lhe facilitou a publicação da brochura Facts about Colonialism. Cabral assumia-se como dirigente de um movimento nacionalista, mas ainda assinava com um pseudónimo.
Em abril, Maria Helena e a filha chegam a Paris. A família iria residir durante vários meses em casa de Mário Pinto de Andrade. No entanto, a fase europeia da vida de Amílcar Cabral estava a chegar ao fim. Para fazer uma revolução africana, era preciso estar em África. Em maio, a direção do PAI instalou-se em Conakry. 


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