AMíLCAR CABRAL
VIII
SPÍNOLA
(Excerto do livro Portugal e o futuro)
O
que importa reter é que a guerra subversiva é uma guerra total, à qual a
população não pode, ainda que o queira, ser indiferente. Contrariamente ao que
sucedia com os conflitos clássicos, em que a população era um fator poderoso
mas não decisivo, aqui ela é o fulcro e o objetivo de toda a ação, só
triunfando o partido que a tiver do seu lado.
Como
pode terminar uma guerra deste tipo? Analisemos em tese as diferentes
possibilidades.
Poderia
admitir-se que o conflito terminasse pelo aniquilamento das forças de
guerrilha. Em relação a esta hipótese há porém que concluir desde já pala sua
inviabilidade, pelo menos num horizonte-tempo definido.
A
guerrilha, pela sua técnica de ação dispersiva, não carece de grandes efetivos
para levar a cabo a sua missão de desgaste; e sendo assim, o recrutamento das
forças de subversão, voluntário ou coercivo, entre a população, por mais
diminuto que seja será sempre suficiente.
A
natural fluidez das fronteiras limítrofes das áreas de guerrilha torna
inesgotável o recurso ao recrutamento externo, sem qualquer hipótese de
denúncia.
Parece,
portanto, de excluir a vitória por aniquilamento físico do inimigo dada a sua
possibilidade de constante renovação.
Poderia
ainda aceitar-se o termo da guerra pela cessação coerciva da atividade das
forças da subversão, uma vez privadas as guerrilhas do seu reabastecimento em
víveres, material e munições. Em relação a este ponto a experiência tem
largamente demonstrado que as forças de subversão contam com apoio externo
inesgotável e este facto, conjugado com a permeabilidade das fronteiras e o
apoio ideológico dos países limítrofes torna utópico o sucesso de qualquer
tentativa para isolar as guerrilhas.
Poderia
tentar-se a vitória conquistando a adesão da população, levando-a à colaboração
ativa contra o inimigo e fazendo-a participar na perseguição à guerrilha. Mas
nesse caso, em boa técnica de subversão, a ação inimiga seria desviada para a
violência sobre a população, em ordem a obter, com a sua adesão ou sem ela, a
cumplicidade do silêncio. A população cede sempre à violência e identifica-se
com o mais forte; e em tal hipótese, ou se sobrepunha à violência das forças de
subversão outra superior, que no balanço fizesse pesar para o lado das forças
da ordem a moral de circunstância – o que de forma alguma pode aceitar-se – ou
ter-se-ia de assegurar à população proteção eficaz, o que implicaria um volume
de forças incomportável para qualquer país. Assim, pela persuasão ou pela
violência, a conquista das populações resulta anulada.
Poderia
alcançar-se a vitória retirando às forças de subversão a vontade de combater
pela adesão da sua massa à causa da ordem estabelecida, ou levando os
interesses que as apoiam a retirar o seu auxílio. Em qualquer dos casos, porém,
seria uma vitória política e não militar.
Podemos
assim chegar à conclusão que, em qualquer guerra deste tipo, a vitória
exclusivamente militar é inviável. Às Forças Armadas apenas compete, pois,
criar e conservar pelo período necessário – naturalmente não muito longo – as
condições de segurança que permitirão soluções político-sociais, únicas capazes
de pôr termo ao conflito.
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