DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

segunda-feira, 29 de abril de 2013


                                                             
                                       AMÍLCAR CABRAL

                                              XVIII

      OS MANUAIS DE GUERRILHA




Tanto os responsáveis pela luta de libertação como os oficiais portugueses conheciam bem os manuais chineses e cubanos de guerrilha. Conta-se que Amílcar Cabral, já em 1959, após o massacre de Pijiguiti, mandara os seus militantes abandonar as cidades e as vilas da Guiné e procurar abrigo no mato ou nos países vizinhos. Por essa altura, não teria ainda lido os textos de guerrilha de Mao Tse Tung. Após a repressão de greves e manifestações nas grandes cidades Mao retirou os seus militantes dos centros urbanos e deu início à Grande Marcha.
Significativamente, foi a Academia Militar de Nanquim que recebeu os que haviam de ser os primeiros guerrilheiros do PAIGC e lhes proporcionou treino militar.  
Anos mais tarde, Cabral declarou a um jornalista da revista Tricontinental que, em matéria de guerrilha, não era preciso inventar nada. Bastava aprender com os combatentes chineses, cubanos, vietnamitas e argelinos, que tinham enfrentado com êxito exércitos convencionais. A verdade é que todos esses guerrilheiros foram beber inspiração a Mao.
A experiência cubana, expressa no pequeno manual de Che Guevara A Guerra de Guerrilha, publicado em 1960, logo a seguir à tomada de Havana, apresentava algumas inovações em relação aos textos do presidente chinês. Demonstrara-se que um grupo de revolucionários, ainda que intelectuais e vindos do exílio em países estrangeiros, era capaz de combater até à vitória. A guerrilha desencadeava uma dinâmica própria, propensa a atrair o apoio das populações. Era o que Régis Débray designava por “teoria do foco”.
A importância de Cabral como dirigente de um partido empenhado numa guerra de guerrilha advém da forma como apreendeu o essencial das reflexões dos seus antecessores e os aplicou à realidade específica da Guiné.
As características geográficas do território foram aproveitadas com habilidade. As florestas densas das zonas ribeirinhas dificultavam o progresso dos militares europeus, que passavam a constituir alvos fáceis quando se deslocavam em zonas de vegetação rasteira. O sul do país apresentava mais obstáculos naturais. Foi aí que começaram os combates. Para mais, era o “chão” dos balantas. Dizia-se que nas cartas geográficas portuguesas vinham representadas todas as curvas dos rios da Guiné, mas que só os habitantes locais lhes conheciam a profundidade e os vaus.
O PAIGC começou como um partido de quadros. Assentava numa pequena burguesia de funcionários administrativos, maioritariamente cabo-verdianos. Muitos deles tinham começado por trabalhar na Guiné como auxiliares das autoridades coloniais. Com o começo da guerra, a esse núcleo juntou-se um grupo crescente de guineenses urbanos com pouca instrução, originários em boa parte de Bissau. O terceiro pilar do partido foi constituído por camponeses entre os quais sobressaíam os balantas e os mandingas, enquanto a etnia fula fornecia a maior parte dos efetivos das tropas africanas que combateram ao lado dos portugueses. 

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