AMÍLCAR CABRAL
XVIII
OS MANUAIS DE GUERRILHA
Tanto os responsáveis pela luta de libertação como os
oficiais portugueses conheciam bem os manuais chineses e cubanos de guerrilha.
Conta-se que Amílcar Cabral, já em 1959, após o massacre de Pijiguiti, mandara os seus militantes abandonar as cidades e as vilas da Guiné e procurar abrigo
no mato ou nos países vizinhos. Por essa altura, não teria ainda lido os textos
de guerrilha de Mao Tse Tung. Após a repressão de greves e manifestações nas
grandes cidades Mao retirou os seus militantes dos centros urbanos e deu início
à Grande Marcha.
Significativamente, foi a Academia Militar de
Nanquim que recebeu os que haviam de ser os primeiros guerrilheiros do PAIGC e
lhes proporcionou treino militar.
Anos mais tarde, Cabral declarou a um jornalista da
revista Tricontinental que, em matéria de guerrilha, não era preciso inventar
nada. Bastava aprender com os combatentes chineses, cubanos, vietnamitas e
argelinos, que tinham enfrentado com êxito exércitos convencionais. A verdade é
que todos esses guerrilheiros foram beber inspiração a Mao.
A experiência cubana, expressa no pequeno manual de
Che Guevara A Guerra de Guerrilha,
publicado em 1960, logo a seguir à tomada de Havana, apresentava algumas
inovações em relação aos textos do presidente chinês. Demonstrara-se que um
grupo de revolucionários, ainda que intelectuais e vindos do exílio em países
estrangeiros, era capaz de combater até à vitória. A guerrilha desencadeava uma
dinâmica própria, propensa a atrair o apoio das populações. Era o que Régis
Débray designava por “teoria do foco”.
A importância de Cabral como dirigente de um partido empenhado numa guerra de guerrilha advém da forma como apreendeu o essencial das reflexões dos seus antecessores e os
aplicou à realidade específica da Guiné.
As características geográficas do território foram
aproveitadas com habilidade. As florestas densas das zonas ribeirinhas dificultavam
o progresso dos militares europeus, que passavam a constituir alvos fáceis quando
se deslocavam em zonas de vegetação rasteira. O sul do país apresentava mais
obstáculos naturais. Foi aí que começaram os combates. Para mais, era o “chão”
dos balantas. Dizia-se que nas cartas geográficas portuguesas vinham
representadas todas as curvas dos rios da Guiné, mas que só os habitantes
locais lhes conheciam a profundidade e os vaus.
O PAIGC começou como um partido de quadros.
Assentava numa pequena burguesia de funcionários administrativos,
maioritariamente cabo-verdianos. Muitos deles tinham começado por trabalhar na
Guiné como auxiliares das autoridades coloniais. Com o começo da guerra, a esse
núcleo juntou-se um grupo crescente de guineenses urbanos com pouca instrução,
originários em boa parte de Bissau. O terceiro pilar do partido foi constituído
por camponeses entre os quais sobressaíam os balantas e os mandingas, enquanto
a etnia fula fornecia a maior parte dos efetivos das tropas africanas que
combateram ao lado dos portugueses.
Sem comentários:
Enviar um comentário