AMÍLCAR
CABRAL
LXVIII
A ORGANIZAÇÃO DA GUERRILHA
Do
lado da guerrilha, verificou-se relativamente cedo que as primeiras bases
criadas no começo da luta armada tinham deixado de corresponder à realidade da
situação militar. Por um lado, a maioria dos ataques envolvia efetivos
reduzidos. Por outro, constituíam alvos fáceis para a aviação portuguesa. Foi
decidido reorganizar os combatentes em grupos mais pequenos que poderiam
reunir-se ocasionalmente para iniciativas mais ambiciosas.
Em novembro de 1964 juraram bandeira os elementos
das primeiras unidades do Exército Popular pensado no Congresso de Cassacá. Com
guerreiros melhor preparados, foi possível abrir novas frentes de combate. No
mesmo Congresso fora criado um Conselho de Guerra que dependia diretamente do
secretário-geral e funcionava como estado-maior.
O Exército Popular compunha-se de unidades chamadas
bigrupos. Contavam com cerca de 40 elementos cada, podendo ser reforçados.
A organização dos combatentes revolucionários
modificou-se ao longo do conflito, de acordo com o equilíbrio de forças e as
alterações no modo português de fazer a guerra.
Em 1965, os comandos militares inter-regiões
mudaram de nome e de funções. Passaram a ser chamados comandos gerais do norte
e do sul. Coordenavam todas ações de combate nas suas áreas. No ano seguinte,
passaram a ser designados por comandos de frente. Em 1969 deu-se nova reorganização. Foi criada a
Comissão Nacional das Regiões Libertadas. Em termos militares, o rio Geba
passou a separar as frentes norte e sul, as quais foram subdivididas em zonas
ou setores.
Em 1971, ocorreu uma nova reestruturação. A marinha
ganhara importância. Passou a ser chamada Marinha Nacional Popular. Juntamente
com o Exército Nacional Popular e as Forças Armadas Locais, compunha as Forças
Armadas Nacionalistas.
A marinha integrava unidades navais e unidades de
fuzileiros, cuja organização assentava também em bigrupos. Em 1971 instrutores russos
começaram a treinar em Conakry uma unidade de homens-rãs.
O exército compunha-se de unidades de infantaria,
artilharia e grupos especiais. A infantaria continuava a assentar a sua
organização nos bigrupos de grande poder de fogo. A dada altura, até as forças
coloniais adotaram esse modelo. Três ou quatro bigrupos formavam um corpo de exército.
A artilharia compreendia grupos mais ou menos clássicos de 50 homens, unidades
de canhões e morteiros com cerca de metade desses efetivos e grupos ainda mais pequenos
de foguetões associados a outros meios antiaéreos. Os grupos especiais incluíam comandos, atiradores especiais com miras telescópicas e operadores de lança-granadas
foguete (bazucas).
As Forças Armadas Locais substituíam as milícias. Assentavam
em grupos de dezanove elementos armados com espingardas Simonov,
pistolas-metralhadoras PPSH e bazucas (RPG-2). Existiam destacamentos femininos
que não entravam em combate. As Forças Armadas Locais combatiam ocasionalmente
ao lado do exército. Desempenhavam essencialmente missões de segurança, aliadas
ao trabalho político. Colaboravam com as populações nos trabalhos agrícolas e
na reconstrução das estruturas destruídas pelo fogo inimigo.
Entre 1972 e 1974, os serviços de informação de
Lisboa estimavam em cerca de 7.500 os combatentes que enfrentavam na Guiné. Pouco
mais de 5.000 integrariam o exército popular, enquanto outros 2.000 fariam
parte das forças armadas locais.
Haveria 2.800 homens a combater na chamada
Inter-Região Norte e 2.500 na Inter-Região Sul. O maior contingente (1.230
homens) enfrentava as forças portuguesas na zona Buba/Quitafine.
As dificuldades de comunicação entre as várias
chefias militares e entre elas e a direção do partido, sediada em Conakry,
repetiram-se ao longo da luta armada. Foi preocupação constante de Amílcar
Cabral subordinar os militares aos políticos. Não foi tarefa fácil.
Havia mais problemas. O cansaço de guerra atingiu
muitos combatentes. O PAIGC chamava os jovens ao combate apelando ao dever cívico
e patriótico. Os guerrilheiros não eram pagos nem tinham um tempo de serviço
contratado. Viviam com dificuldades e alimentavam-se mal.
A colocação dos militares em áreas distantes das
suas moranças originava dificuldades de adaptação. “No Gabu, mais de 40% dos efetivos abandonaram as suas unidades, saindo à procura do caminho para
regressar às suas casas”. Os dirigentes do PAIGC procuraram
contornar este problema passando a distribuir preferencialmente os combatentes
pelas suas regiões de origem.
Embora, numa guerra de guerrilha, o número de
soldados revolucionários, distribuídos por unidades de grande mobilidade, seja
sempre muitas vezes inferior ao número de efetivos dos exércitos regulares, que
combatem mais fixados a posições defensivas, nem sempre o recrutamento de
voluntários para o PAIGC correspondeu às expectativas dos seus dirigentes.
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