DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

domingo, 12 de março de 2017


CARLOS NUNES PINTO

TAMEGÃO




XXVI

          “Os brancos dizem:
          − Nossa Senhora nos acuda.
          Os negros:
          − Faz só favor, senhora.”

Tamegão, filósofo de esteira no chão, fumando cachimbo com palha de erva (qual eu não sei) explicou-me:
− Os branco quando ouve trovoada da faísca começa a rezar na santa deles. A gente não, se compromete com o feiticeiro, le promete as galinha, cabrito, outras coisas.
Se lembra no outro dia? Tchitucuta saiu na caça. Arma que tinha roubou no ferreiro Zé Maria. Os ferros da ponta tinha veneno para as cabra se adormecer por dentro. Tchitucuta dormiu duas noites no mato. Quando queria já voltar, apareceu olongo. O bicho era grande. Falhar não podia. Começou se deitar. Se deitou de vez, de sempre.
Problema ficou só levar carne toda no quimbo. Tirou pele com mutunga, cortou bocado que pode levar e resto deixou dentro, para mosca não atacar.
Quando chegou no quimbo, os outro não se desconfiaram por causa que ele se endireitou nas costa. Outro dia foi lá outra vez, trouxe mais bocado; no outro dia também.
Um le falou:
− Você apanhou caça grossa?
− Apanhou, não diz mais ninguém, eu te dá um pouco de porção.
Por aí ficou o segredo, mas segredo não fica só num lugar.
O sipaio le disse:
− Eu vai queixar no senhor fiscal. Você ficou usar zagaia envenenada.
Tchitucuta estremeceu. Sabia que porrada era grande demais.
O fiscal o prendeu. Quanto tempo eu não sabe. ficou cego, que doença eu também não sabe. Quando le soltaram já não vê nada.
Começou a se lembrar das caçada, das mulheres pilar o milho, algumas com filho nas costas. Ficou saudoso da vida.
Tamegão continuou:
- Uma noite, Tchitucuta se ausentou no capim. Procurou até encontrar o barulho das trovoada.
Falou na santa do branco, parece se chama Bárbara.
− Me envia luz nos meus olho.
Parece tal santa ficou com pena dele. Os olho se acendeu outra vez.
Tchitucuta, naquele sítio azul viu, na frente, porta muito grande, para cima e para os lado. Nuvens brancas que parece algodão se colavam na madeira grossa. Tal de porta não se conseguiu fechar completo. Cheio de medo, espreitou e viu lá dentro tantas coisas bonitas.
Se espantou.
− Afinal aqui tem outra terra?
Timidamente pediu:
− Me dá com licença de entrar, Senhora?



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