CARLOS NUNES PINTO
TAMEGÃO
XXV
“O que parece, às vezes
engana.”
Quase tudo era fácil em
Angola. Até mesmo mudar de casa. Ou porque os alugueres eram baratos ou,
simplesmente, porque o capricho das esposas brancas prevalecia.
− Hoje vi uma casa bonita,
com duas palmeiras no quintal.
O marido só responde:
− Hum…
Meses mais tarde:
− Temos que mudar de casa.
Os pássaros que fazem ninhos nas palmeiras cagam o chão todo.
− Hum… − dizia o marido.
Esta reação dos homens
compreendia-se. Não eram eles que carregavam a tralha toda. Bastava-lhes dar
uma ordem ao capataz:
− Arranja homens e vai
mudar as coisas da casa velha. Toma lá estas duas chaves. Esta é da velha e a outra é
da nova.
Lá iam numa camioneta.
Tamegão, desta vez, quis
ajudar.
Durante uma das mudanças,
João de Sousa foi ver como estavam a correr as coisas.
Viu Tamegão descer as
escadas do primeiro andar transportando, a muito custo, um faqueiro daqueles
que se ofereciam sempre nos casamentos. Cansado, mas de verdade, pousou-o em
cima duma mesa que ainda ali estava e pediu:
− Senhor João, eu pode
abrir esta caixa?
− Podes.
Quando viu tantas
colheres, pequenas e grandes, tantos garfos e facas, se admirou.
− Eh, patrão, é para quê
essas ferramenta toda?
− Não vês que é para a
gente usar quando come?
− Precisa assim? Os pretos
só precisa uma.
− Fazem sempre falta,
Tamegão.
− Por causa que é o preto
que carrega. Quando era o senhor João, um garfo só chega.
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