TAMEGÃO
CARLOS NUNES PINTO
VI
“ O pilão
transforma em pó o sabor do milho maduro”
Já a chuva estava a
cheirar, era preciso começar a cavar o arimbo, não muito fundo, para não magoar
a terra.
O milho que estava
guardado na quinda ia-se misturar com a água e dar lindas maçarocas. Grande era
o milagre das chuvas.
Depois, era só ouvir o
tum-tum do pilão. O milho se transformava no pirão nosso de cada dia.
Vi chegar o padre Carlos.
− Bom dia, Tamegão.
− Bom dia, senhor padre.
− Estas terras agora estão
muito bonitas – tudo verde.
− As mulheres pintaram
assim – respondeu o Tamegão.
− Tens razão, mas olha que
há mais alguém que as ajuda a plantar.
− Não, senhor padre. Aqui
os homens não ajuda. Quem ajuda é só a chuva.
− E quem é que faz a
chuva?
− Parece que é a água,
senhor padre.
−Um dia destes, hás de
entender… Bem, vou andando.
Já o padre ia um pouco
distante quando ouviu o Tamegão perguntar;
− É Deus?
Padre Carlos estancou.
− Afinal, tu sabes que
Deus existe?
− O menino me falou que
tem um Deus num lugar que ninguém lhe vê.
Mais tarde, padre Carlos ralhou
comigo.
− Então, andas pelos
quimbos a falar do Senhor?
− É pecado, senhor padre?
− Acaba com isso! Cada vez
os confundes mais.
A medo, eu ainda disse:
− O senhor padre sabe que
o Tamegão também faz milagres?
− Cala-te!
− Foi ele que me disse que
plantou esses arimbos todos de verde, que as mulheres só ajudaram. Acreditei,
porque vi a chuva pintar de verde o castanho queimado do chão. Não me venha o senhor padre dizer que ali não
há dedo do Tamegão. Talvez seja o sexto, não sei…
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