TAMEGÃO
CARLOS NUNES PINTO
XV
“ Recensear para os brancos é contar as pessoas, para mim é contar as almas “
−Tamegão, você tem que ir
no recenseamento, já lhe avisei na semana passada – disse o sipaio.
− Tá bem, eu hoje vai.
Vestiu a camisa branca das
festas e foi direitinho à Administração.
Estava uma grande fila,
colocou-se no fim.
Reparou que estava ali um
senhor branco que punha um número no peito das pessoas, depois espreitava para
dentro de uma caixa preta, apertava um botão e dizia: já está!
Chegou a vez do Tamegão. O
mesmo ritual. Depois do “já está”, Tamegão foi conduzido para outra mesa, onde
o Chefe do Posto perguntou:
− Como te chamas?
− Tamegão.
− Tamegão quê?
Não entendeu, o chefe teve
de lhe explicar.
− Tens de dar dois nomes.
Se tem aqui outro Tamegão como é que a gente sabe que você não é o outro?
Ficou mais confuso.
− Neste mundo só tem um
Tamegão.
− Diz lá, Tamegão…
qualquer coisa.
− Quarquer – Coisa eu não
gosta.
− Se queres ficar sem
coisa nenhuma, pronto, podes ficar!
− Tamegão Sem- Coisa-
Nenhuma ainda é pior.
− Então, em que ficamos?
− Fica só Tamegão.
Assim ficou, como sempre
foi.
− Sabes escrever?
− Sei, sim senhor –
mentiu.
− Então, assina aqui o teu
nome.
Tamegão desenhou uma bola
grande e outra mais pequena lá dentro.
− Já estás com a mania dos
brancos que assinam com a marca do gado? Para a semana passa por cá, que já
está tudo pronto.
Nessa tarde, fui visitar o
Tamegão.
− Onde é que foste de
manhã?
− Nesse tal de
recenseamento. Me perguntaram se sabia escrever o meu nome e eu escreveu.
− Como foi que fizeste
isso?
− Eles queria dois nomes,
eu assinou uma bola grande com uma mais pequena lá dentro.
− O que é isso quer dizer?
− Bola grande sou eu, bola
pequena é o Menino. Agora eu ficou “Tamegão Carlitos”.
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