DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

                  
          JE NE SUIS PAS CHARLIE!

                                II


Há quem diga que a guerra generalizada entre cristãos e muçulmanos já começou. O Estado Islâmico do Iraque e da Grande Síria (ISIS) assenta num grupo jihadista que proclamou um califado nas regiões que domina na Síria e no Iraque. Abu Bakr al-Baghdadi foi nomeado califa e reclama autoridade religiosa sobre todos os muçulmanos do mundo. Provavelmente, não viverá muito tempo.
Os jihadistas movimentam-se à vontade em meia dúzia de países, do norte do Pakistão ao Chade, e exploram campos petrolíferos.


Curiosamente, esse exército islâmico radical está a exercer um notável efeito de atração entre jovens muçulmanos residentes em países ocidentais. São milhares os que deixam o conforto da vida na Europa para irem lutar e morrer pelo califa.  
A guerra, por enquanto, é essencialmente civil. As vítimas dos combates publicitados quase diariamente nas televisões são quase todas muçulmanas. Poderá deixar de ser assim, se os ataques aéreos efectuados pela NATO e pelos seus aliados passarem a ser complementados com a participação de tropas terrestres ocidentais.


Por outro lado, não cessam os apelos para que os militantes islâmicos façam correr o sangue dos cristãos nos seus países de acolhimento. Os atentados de Paris enquadram-se neste contexto.
A tratar-se duma guerra, será conveniente ter em conta todos os factores que lhe possam influenciar o desenlace. Poucos combates se ganham quando não existe o cuidado de compreender as diversas características das partes que se opõem nem se faz um esforço para reduzir o número de possíveis inimigos, chamando para o nosso lado todos os elementos aproveitáveis. Os chefes militares procuraram sempre conquistar aliados.
Bem… Nem sempre. No Leste de Angola, durante os primeiros anos da década de 70, ocorreu a chamada «Operação Madeira». O general português Bethencourt Rodrigues e o chefe guerrilheiro Jonas Savimbi iniciaram negociações intermediadas por madeireiros e alcançaram um acordo: a UNITA e o exército português não se atacariam mutuamente, libertando forças para combaterem o MPLA e a FNLA. A situação militar no Leste passou a ser favorável aos militares de Lisboa.
Em Abril de 1973, Bethencourt Rodrigues foi substituído pelo general Abel Raposo Hipólito. Em Setembro, Hipólito lançou uma vasta ofensiva sobre as bases da UNITA e garantiu a Portugal a hostilidade daquele movimento. Não terá prestado grande serviço ao seu país.
Prossigamos. O assassinato bárbaro dos jornalistas do Charlie Hebdo foi encarado como um ataque inaceitável à liberdade de expressão.



Ora, a liberdade de expressão, como todas as liberdades, acaba quando afecta a liberdade e a dignidade dos outros. Servem para alguma coisa as caricaturas do profeta Maomé? Alguém ficou mais feliz, ou mais sabedor, depois de as ver? No meu ponto de vista, tratou-se de provocações gratuitas e perfeitamente dispensáveis. A estupidez e a violência da resposta não dão razão às vítimas, que a não tinham. Mesmo os muçulmanos moderados, que pretendem viver em paz na Europa, se sentem humilhados e ofendidos com o que consideram um desrespeito por um dos seus símbolos mais sagrados.
De que serve lançar gasolina na fogueira?

                      Continua

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