AMÍLCAR CABRAL
LIII
LUÍS CABRAL, ARISTIDES PEREIRA, VASCO CABRAL
No
cimo da hierarquia política do PAIGC posicionaram-se três nomes de apelido
“Cabral”: Amílcar, Luís e Vasco. Com eles trabalharam Aristides Pereira e Pedro
Pires.
Luís Cabral e Agostinho Neto com Fidel Castro
Luís
de Almeida Cabral, meio-irmão de Amílcar foi, por virtudes próprias, um dos
dirigentes mais importantes do PAIGC. Viria a ser o primeiro presidente da
Guiné-Bissau.
Nasceu
em Bissau em abril de 1931. Era filho de Juvenal Cabral e da única mulher com
quem ele casou oficialmente, Adelina Rodrigues Correia. Contabilista, empregou-se em Bissau na Casa Gouveia, uma sucursal da C.U.F.
Já depois do massacre de Pidjiguiti, mudou-se para a vizinha Guiné-Conakry. Sete anos mais novo do que Amílcar, cresceu politicamente à sombra do seu carismático irmão. Foi cofundador do PAIGC, numa data que os historiadores oficiais gostam de fixar em 1956, mas que ocorreu provavelmente alguns anos mais tarde.
Em 1963, dois anos depois de ter fundado, em Conakry, a
União Geral dos Trabalhadores da Guiné (UNTG), entrou para o Comité de Luta. Após o congresso de Cassacá, quando as seis Zonas de guerrilha foram substituídas por três frentes com chefias mistas, militar e política, Luís Cabral associou-se a Francisco Mendes no comando na Frente Norte.
Em 1965, foi nomeado para dirigir o conselho de Guerra. Em 1967, foi encarregado da administração do partido e das suas relações internacionais.
Em Agosto de 1971, foi eleito para o secretariado
permanente do Comité Executivo da Luta, com a responsabilidade de reconstruir
as "zonas libertadas" pelo PAIGC na guerra pela independência. Eleito deputado à A.N.P. pelo círculo de Bissau em
1971, assumiu, nesse mesmo ano, a direção da luta na Frente Norte.
Após o assassinato de Amílcar Cabral, a liderança do PAIGC foi entregue a Aristides Pereira, com o ramo guineense controlado por Luís Cabral. Em julho
de 1973, no segundo Congresso do PAIGC, Luís Cabral foi eleito secretário-geral adjunto do
partido.
Quando o PAIGC
declarou unilateralmente a independência da Guiné, em setembro de 1973, ficou a presidir ao Conselho de Estado.
No ano seguinte, após o 25 de abril e o reconhecimento formal da independência da Guiné por parte de Portugal, tornou-se o primeiro presidente da Guiné. Note-se que a independência de Cabo Verde foi reconhecida apenas em 1975.
No ano seguinte, após o 25 de abril e o reconhecimento formal da independência da Guiné por parte de Portugal, tornou-se o primeiro presidente da Guiné. Note-se que a independência de Cabo Verde foi reconhecida apenas em 1975.
O
pós-guerra foi difícil na Guiné-Bissau. Uma plêiade de combatentes magníficos
nada sabia fazer sem as armas na mão. A guerra reduzira a pouco a já frágil
estrutura económica do território. Os quadros disponíveis eram cabo-verdianos e
mal aceites pela população local. Apesar da ajuda internacional, a
incompetência e a corrupção iam tomando parte do País. A verdade é que os
colonos faziam falta.
A
utopia da ligação fraterna entre a Guiné e Cabo Verde chegou ao fim com certa
naturalidade. Em novembro de 1980, Luís Cabral foi deposto, num golpe de estado
sem derramamento de sangue, pelo seu primeiro-ministro e antigo chefe das
forças armadas, João Bernardo (Nino) Vieira. O ex-presidente foi acusado de abuso
do poder e condenado à morte. Uma das acusações era a responsabilidade pela execução de milhares de militares africanos que tinham lutado ao lado de Portugal. Eram quase todos guineenses. Acabou por ficar 13 meses em regime de prisão
domiciliária, antes de ser autorizado a deixar a Guiné.
Viveu em Cuba de 1981 a 1983. Tentou regressar a Cabo Verde, mas as várias cartas que escreveu a Aristides Pereira a manifestar essa intenção ficaram sem resposta. O governo português, com o apoio do Presidente Ramalho Eanes, ofereceu-lhe asilo político em Lisboa.
Luís Cabral chegou no começo de 1984. Após a queda de Nino Vieira, ainda esteve na Guiné por um curto período de tempo. Viria a morrer
em Torres Vedras, em maio de 2009.
Aristides
Maria Pereira nasceu na ilha de Boavista, em Cabo Verde, em 1923 e foi colega
de Amílcar Cabral no liceu Gil Eannes. Aos vinte e cinco anos, emigrou para a
Guiné-Bissau e empregou-se como técnico radiotelegrafista. Começou cedo a sua
atividade política nacionalista, procurando organizar a contestação urbana ao
poder colonial. Reencontrou Amílcar, já engenheiro, em Bissau e ajudou a
fundar o Partido Africano da Independência (PAI), que mais tarde se
transformaria no PAIGC.
Após
o congresso realizado na tabanca de Cassacá, assumiu a direção política da
Frente Sul, em parceria com Nino Vieira. Aproximadamente na mesma altura, foi
nomeado secretário geral-adjunto do partido. Ocupou o cargo até à morte de
Cabral. No II Congresso do PAIGC, sucedeu-lhe, como secretário-geral.
A
independência de Cabo Verde ocorreu a 5 de julho de 1975 e Aristides Pereira
foi empossado como Presidente do novo País. Acumulou essas funções com as de
secretário-geral do partido durante 16 anos. Pedro Pires foi sempre o seu
primeiro-ministro.
Ao
longo desse tempo, a equipa governativa teve de enfrentar algumas crises
políticas. Em 1977 ocorreu uma tentativa de revolta contra o Estado e foram
presos alguns cidadãos. No final da década de setenta, ocorreu a cisão entre
“históricos” e “trotskistas” no seio do PAIGC. Em 14 de novembro de 1980, o
golpe de estado de Nino Vieira pôs termo ao PAIGC como partido de duas nações e
o braço cabo-verdiano passou a chamar-se PAICV. No ano seguinte, deu-se a crise
da reforma agrária na ilha de Santo Antão.
O
ano de 1989 ficou ensombrado pela morte de Renato Cardoso. Cardoso, licenciado
em Direito em Lisboa e cristão protestante, era um homem brilhante. Apesar de
ser bem mais socialista que marxista, foi conselheiro do primeiro-ministro e
desempenhava, na altura da sua morte, as funções de Secretário de Estado da Administração
Pública. Não alinhava nem com os “históricos” nem com os “trotskistas” do “grupo
de Lisboa”. A seu pedido, foi recebido por Aristides Pereira na véspera da sua
morte e revelou que receava ser preso. O Presidente não terá levado a sério as
suas preocupações. O assassínio ocorreu a 29 de setembro de 1989. O crime nunca
foi desvendado e os seus autores (ou autor) permanecem impunes.
A
direção de Aristides Pereira caracterizou-se por uma política externa de não-alinhamento
face às grandes potências mundiais, com uma certa aproximação à China e à
Líbia. Internamente, procurou melhorar as condições de vida dos camponeses. O
essencial da política do governo cabo-verdiano durante este período foi exposto
por Leston Bandeira na sua biografia de Pedro Pires. Pôs-se em prática o
projeto antigo de reter a água das chuvas e deu-se início a um programa de
reflorestação. Cresceram as áreas de regadio. A ajuda alimentar internacional
não era distribuída gratuitamente pelas populações, sendo os produtos introduzidos
no mercado e o produto das vendas convertido num “Fundo de Reconstrução
Nacional” que pagava as obras públicas do país.
Segundo
Vicente Lopes, Aristides Pereira era introvertido, austero e reservado. “Aristides
Pereira não tinha grandes veleidades ideológicas. Era um chefe de família e
provavelmente dirigia Cabo Verde nessa perspetiva”. As suas características
pessoais e a “cautela e reserva” com que acompanhava o processo político terão
evitado que “o regime aqui em Cabo Verde se tornasse tão extremista como em
Angola, Moçambique, Guiné e São Tomé”.
Em
fevereiro de 1991, o regime democratizou-se e tiveram lugar as primeiras
eleições presidenciais. Aristides foi derrotado por António Mascarenhas
Monteiro, candidato apoiado pelo MDP que vencera já as eleições legislativas.
Encerrada a sua carreira política, Aristides Pereira mudou-se para Portugal.
Em
2003, publicou o livro “O Meu Testemunho. Uma Luta, Um Partido, Dois Países”, em
que fala da sua experiência durante o período da luta armada e ao longo do
exercício da função presidencial em Cabo Verde.
Faleceu
em Coimbra, em setembro de 2011.
Vasco
Cabral não é familiar de Amílcar nem de Luís. Trata-se de uma coincidência de
nome. Nasceu em Farim, na Guiné Portuguesa, em 1926. Estudou na
Universidade Técnica de Lisboa. Foi militante do MUD juvenil, um movimento
unitário de oposição à ditadura fascista, fortemente influenciado pelo PCP.
Em
1949, colaborou ativamente na campanha de Norton de Matos, candidato da
Oposição antissalazarista à Presidência da República Portuguesa. Em 1950
concluiu o curso de Ciências Económicas e Financeiras. Em 1953 participou,
em Bucareste, no IV Festival Mundial da Juventude. Foi preso pela polícia
política salazarista, ao regressar a Lisboa. Esteve encarcerado no Aljube e em
Caxias e só foi libertado cinco anos mais tarde.
Militante comunista, Vasco Cabral passou à
clandestinidade em 1961. No ano seguinte, o Partido Comunista Português (PCP) organizou
uma fuga coletiva de estudantes anticoloniais. Vasco Cabral embarcou com
Agostinho Neto rumo a Tânger. Foi depois ao encontro de Amílcar para se juntar
ao PAIGC e lutar pela independência da Guiné-Bissau e de Cabo Verde.
Terá sido um dos teóricos do PAIGC. De acordo com alguns testemunhos, manteve, ao longo
da vida certa ligação ao PCP.
Não
se opôs ao golpe de Nino Vieira. Foi Ministro da Economia e Finanças, Ministro
da Justiça e Vice-Presidente da Guiné-Bissau. Teve ainda tempo para dedicar à
poesia, alinhando com a escola neorrealista corrente na sua época. Publicou, em 1981, o
livro “A Luta é a minha primavera” que reúne seis dezenas de poemas escritos
entre 1951 e 1974. Foi fundador da União Nacional de Escritores da
Guiné-Bissau.
Faleceu, em Bissau, em 2005.
ONDE ESTÁ A POESIA?
A poesia está nas asas da aurora
quando o sol desperta.
quando o sol desperta.
A poesia está na flor
quando a pétala se abre
às lágrimas do orvalho.
quando a pétala se abre
às lágrimas do orvalho.
A poesia está no mar
quando a onda avança
e branda e suavemente
beija a areia da praia.
quando a onda avança
e branda e suavemente
beija a areia da praia.
A poesia está no rosto da mãe
quando na dor do parto
a criança nasce.
quando na dor do parto
a criança nasce.
A poesia está nos teus lábios
quando confiante
sorris à vida.
quando confiante
sorris à vida.
A poesia está na prisão
quando o condenado à morte
dá uma vida à liberdade.
quando o condenado à morte
dá uma vida à liberdade.
A poesia está na vitória
quando a luta avança e triunfa
e chega a Primavera.
quando a luta avança e triunfa
e chega a Primavera.
A poesia está no meu povo
quando transforma o sangue derramado
em balas e flores
em balas para o inimigo
e em flores para as crianças.
quando transforma o sangue derramado
em balas e flores
em balas para o inimigo
e em flores para as crianças.
A poesia está na vida
porque a vida é luta
porque a vida é luta
Vasco Cabral
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