DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sexta-feira, 24 de abril de 2020




A “ORA MARÍTIMA” DE AVIENO

Rufus Avienus Festus, poeta romano interessado em Geografia, escreveu no século IV a Ora Marítima (Orla Marítima), um poema épico inspirado em viagens por mar. Apoiou-se em textos anteriores e recorreu a termos geográficos já em desuso. Embora tenham surgido dúvidas quanto aos nomes, parece designar por Oestreminis o território português, enquanto usa o termo Albion para referir a Inglaterra.



Terá estudado um número considerável de escritos anteriores. Na dedicatória a Probo, faz referência a Hecateo de Mileto, Helânico de Lesbos, Fileo de Atenas, Esxilax de Carianda, Pausímaco de Samos, Damasto de Sige, Bacoris de Rodas, Cleón da Sicília, Heródoto de Turios e Tucídides de Atena. Como vemos, foi cuidadoso com a bibliografia.
Este poema descreve parte da costa marítima da Europa Ocidental, incluindo Portugal, Galiza e França. Poderá referir-se também às Ilhas Britânicas.



Avieno chama Ofiússa (Terra das Serpentes) a uma parte da Península Ibérica. A Ofiússa teria sido habitada pelos Estrimnios (Oestrimnides, habitantes do extremo oeste), provavelmente um povo integrante da cultura megalítica europeia. Teriam sido expulsos das suas terras por uma invasão de serpentes. Há quem sugira que as serpentes simbolizavam os sefes, povo celta que emigrou para a Península. A palavra sefes derivará do termo grego serpe (serpente). Serpa, no Alentejo, terá herdado o nome por inteiro.



Os povos da Ofiússia seriam os cempsos, instalados no Alto Alentejo, os sefes, que ocupariam os vales do Douro e do Tejo e os draganos que viveriam mais a norte. Os ligus, ou Lycis, poderiam corresponder aos lusitanos. Mais a sul habitariam os cinetes. Sigamos Avieno:
Os cempsos e os sefes dominam as colinas escarpadas das terras de Ofiusa; perto deles, o ágil lúcio e a raça dos draganos instalaram os seus lares sob o setentrião rigorosamente nevado. Depois, junto aos cempsos, encontram-se os povos dos cinetes. Os cónios ou cinetes habitavam as atuais regiões do Algarve e Baixo Alentejo.
Escreve Avieno um pouco adiante:
Na continuação encontra-se o imponente rochedo Sagrado, eriçado de penhascos e consagrado a Saturno. Ferve o mar agitado e a costa desprega uma frente rochosa.


       Julgo que o rochedo sagrado é a Ponta de Sagres.
Na Ofiússa, Avieno situa no atual território português diversas ilhas e cabos. O arquipélago das Berlengas seria uma ilha dedicada a Saturno, mas tal não é certo. O cabo de Ofiússa é provavelmente o cabo da Roca. O Cabo Ceprésico seria o Espichel e a ilha de Ácala corresponderia à Península de Troia, antigamente despegada do continente. Na sua proximidade é referido um largo porto, que deve ser o de Setúbal.
Avieno chama Cabo Cinético ao Cabo de São Vicente e situa ali a entrada no Oceano.
O poeta não poupa louvores aos habitantes da antiga Estrimnis, embora lhes aponte a fragilidade das embarcações:
Aqui se encontra uma raça de grande vigor,de espírito altaneiro e de uma habilidade eficiente, imbuída de uma inquietação constante pelo comércio. Sulcam com os seus patachos um mar agitado e o abismo do oceano, aventurando-se a grandes distâncias. De facto, não sabem fazer as quilhas com madeira de pinho nem guarnecem as embarcações com madeira de abeto mas, o que é algo realmente surpreendente, preparam as embarcações com peles entrelaçadas e amiúde atravessam o extenso mar salgado nesses couros. 
 Há quem considere o poema “Ora marítima” um roteiro de navegação. Trata-se de uma das fontes mais antigas de informações sobre os povos que habitaram o nosso território.

BIBLIOGRAFIA
Ora Marítima em castellano. Cultura en Andalucía, Internet.
Ora Maritima. Wikipedia.

Imagens: Internet

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