DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

MÁSCARAS II




A crença no poder das máscaras prevalece, nos nossos dias, em comunidades animistas que consideram que os espíritos habitam a água e as plantas. Para esses povos, a morte é parcial. Ao morrer, passa-se para uma forma de vida mais diluída, sem deixar de se interferir nos assuntos dos viventes, quer favorecendo-os, quer atravessando-lhes obstáculos no caminho.


As máscaras facilitam o intercâmbio entre o mundo de cá e o Além. Ao serem colocadas para a dança, dão aos espíritos a visibilidade que lhes falta. Por outro lado, emprestam aos homens algumas qualidades simbólicas dos animais nelas esculpidos: a visão da águia, a rapidez do leopardo e o poder do elefante e do leão.


A imaginação dos artistas africanos parece inesgotável. As suas obras vão da representação realista de pessoas e animais até graus elevados de abstração.


Diversos artistas europeus do fim do século XIX e do começo do século XX foram buscar aos modelos africanos inspiração para dar corpo a novas correntes de pintura.



Os modelos de máscaras são transmitidos em cada tribo de uma geração para outra, sem coartarem a liberdade criadora dos artistas. A estética evolui e a tradição enriquece.



Há fatos que obrigam a repensar a questão da autenticidade. Os artesãos tribais talhavam máscaras e estatuetas com intenções específicas. Destinavam-se a cumprir funções magico sociais. Supunha-se que se estabelecia uma relação espiritual entre o artista e o produto da sua arte. 
O tempo muda tudo. O contacto com os europeus fez nascer o mercado do artesanato e os objectos mágicos tradicionais passaram a ter funções decorativas. 
Em Angola, milhões de pessoas abandonaram os quimbos e mudaram-se para a periferia das grandes cidades. Julgo que os grupos que procuram preservar as tradições nos musseques vão comprar os artigos de culto aos mesmos locais onde os adquirem os turistas.  Qual será então, nos dias de hoje, a diferença entre uma estatueta sagrada e outra semelhante que vai enfeitar uma estante ou uma parede?
Julgo que reside apenas na intenção de quem o utiliza. O significado é-lhe dado pelo uso. É mágico enquanto serve finalidades mágicas. Torna-se profano nas mãos de gente sem fé.


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