DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014




  A HISTÓRIA PERTO DE NÓS      


       LEMBRANDO AMÍLCAR E LUÍS CABRAL


               NOTAS RETIRADAS DA CONVERSA COM JUVELINA ROCHA, 
                        IRMÃ DE LUÍS E MEIA-IRMÃ DE AMÍLCAR, 
                        E COM O SEU MARIDO ANTÓNIO ROCHA

                                                  II


Durante a guerra da independência, a presença das mães dos dois líderes revolucionários era tolerada pelo regime português, embora a PIDE se lembrasse ocasionalmente de incomodar a família. Adelina chegou a ser interrogada durante várias horas seguidas. Levavam fotografias ao local de trabalho de Juvelina e pediam-lhe que identificasse as pessoas que conhecia. Um dia, um oficial perguntou-lhe se ela não gostaria de estar antes a secretariar os irmãos. Juvelina disse logo que sim.

LUÍS CABRAL, NO TEMPO DA GUERRA DA INDEPENDÊNCIA

Apesar de viverem relativamente perto uma da outra,Iva e Adelina não se falavam. Conta António Rocha: «A Juvelina diz que se lembra apenas de as duas falarem, após a independência, com o Luís já Presidente, mas só quando eram obrigadas a encontrarem-se.» Faleceram ambas em Bissau.


                         AMÍLCAR NUMA EMBARCAÇÃO ARTESANAL

   No dia da morte de Amílcar Cabral, a mãe encontrava-se em Moçambique (Xai-Xai), de visita ao filho Toy. Adelina Rodrigues Correia estava na Guiné. Para além de chocada, encheu-se de medo de que matassem também o seu Luís. Luís Cabral encontrava-se em Zinguinchor. Viajou nesse dia para Dakar para coordenar a receção de doações, sobretudo de arroz. Soube da morte do irmão na tarde do dia 21. Ao aproximar-se das instalações do partido, deparou com um aglomerado de militantes do PAIGC. Havia muita gente a chorar.
Juvelina viveu na Guiné até ao golpe de estado de João Bernardo Vieira, ocorrido a 14 de novembro de 1980. Fez o Curso Comercial e começou por trabalhar, durante perto de dois anos, como funcionária das Obras Públicas do governo da colónia. Empregou-se depois na Casa Gouveia, pertencente ao grupo CUF. Passou a seguir por várias empresas e acabou por se fixar na Farquímica, do ramo farmacêutico.
  Após o 25 de abril e o reconhecimento formal da independência da Guiné por parte de Portugal, Luís Cabral tornou-se o primeiro presidente da República da Guiné-Bissau.

  JUVELINA COM JOÃO PAULO II (Castel Gandolfo, verão de 1979)

Algum tempo depois, Juvelina foi convidada a integrar a equipa fundadora da empresa estatal destinada a regular a importação e a distribuição de medicamentos, a Central Farmedi. Apoiada por um conselheiro técnico sueco, por um técnico de contas português e por alguns quadros nacionais, criou uma rede de farmácias e ajudou fazer crescer a Farmedi, que se tornou uma das maiores empresas públicas guineenses. O seu trabalho foi reconhecido e Juvelina ascendeu ao cargo de Diretora-geral adjunta.

REENCONTRO COM O PAPA. 
ANTÓNIO ROCHA ESTÁ À DIREITA DA ESPOSA
             Palácio presidencial de Bissau, 28/1/1990

Juvelina casou em 1959 com Abel Ventura e teve 2 filhos, ambos já falecidos (Luís Abel e João Carlos). O mais velho deixou-lhe um neto Chama-se João Carlos Gonçalves Cabral Ventura Rocha e vai nos 21 anos. Foi adotado por António José e criado pelo casal desde os quatro de idade. Queixa-se com ternura e ironia: «é chato ter de explicar que o meu pai é o marido da minha avó!»
  António Rocha tem uma filha do primeiro casamento, agora com 37 anos.

     LUÍS CABRAL, O MARECHAL TITO DA JUGOSLÁVIA E JUVELINA

O pós-guerra foi difícil no jovem país. Uma plêiade de combatentes magníficos nada sabia fazer sem as armas na mão. O conflito armado reduzira a pouco a já frágil estrutura económica do território. Os quadros disponíveis eram maioritariamente cabo-verdianos, mal aceites pela população local. Apesar da ajuda internacional, a incompetência e a corrupção iam tomando parte do País. A verdade é que os colonos faziam alguma falta.
A utopia da ligação fraterna entre a Guiné e Cabo Verde chegou ao fim com certa naturalidade. Em novembro de 1980, Luís Cabral foi deposto, num golpe de estado quase sem derramamento de sangue, pelo seu primeiro-ministro e antigo chefe das forças armadas, João Bernardo (Nino) Vieira.

JOÃO BERNARDO VIEIRA

O ex-presidente foi acusado de abuso do poder e condenado à morte. Uma das acusações era a corresponsabilidade pela execução, em dezembro de 1978, de centenas de militares africanos (quase todos guineenses) que tinham lutado ao lado de Portugal. 


                  COMANDOS AFRICANOS AO SERVIÇO DE PORTUGAL

     Os fuzilamentos foram decididos por um grupo de dirigentes do PAIGC liderados por António Buscardini, chefe da polícia política. Os corpos foram enterrados, em valas comuns, nas matas de Cumeré, Portogole, Cuntima, Farm, Bafatá, Cacheu, Canchungo, Pirada, Bambadinca, Biombo e Bissorã. As razões para justificar estas execuções sumárias, prendem-se com o facto das autoridades instituídas temerem um golpe de estado, liderado por Malam Sanhá, ex-comando da tropa colonial. Buscardini era o todo-poderoso diretor nacional da Segurança do Estado. Suicidou-se, ou foi morto, no dia do levantamento de Nino Vieira.
Luís Cabral acabou por ficar 13 meses em regime de prisão domiciliária, antes de ser autorizado a deixar a Guiné.

LUÍS CABRAL COM GUERRILHEIROS DO PAIGC

     António Rocha conta que Luís Cabral chegara a recear o chefe da sua polícia política. Segundo a família, Luís era um homem romântico, sensível e generoso, sem «queda» para ser um Presidente à moda Africana. No entanto, é bem sabido que, por vezes, o hábito faz o monge. 



FOTOGRAFIAS: ARQUIVO PESSOAL DE JUVELINA ROCHA, INTERNET.





4 comentários:

  1. Bonjour, J'aimerais savoir si Luis Abel Ventura était celui qu'on appellait "Luisinho" et que j'ai connu à Bissau au début des années 1980? Merci d'avance - Daniel

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    1. oui est Luisinho. Il est mort, malheureusement, au milieu des années 1990 au Portugal.

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    2. oui est Luisinho. Il est mort, malheureusement, au milieu des années 1990 au Portugal.

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  2. Muito obrigado por resposta. C'est avec beaucoup de tristesse que j'apprends cette mauvaise nouvelle. J'étais assez proche de Luisinho et je l'aimais bien. J'ai pu compter sur sa loyauté sans faille lors de moments difficiles. Merci de transmettre toutes mes condoléances à sa mère. Daniel.

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