ESTRANHOS ALMIRANTES
I
ARTEMÍSIA
DE CÁRIA
Artemísia de Cária, rainha
de Halicarnasso, foi a primeira mulher almirante conhecida. Apesar de ter ascendência
helénica, aliou-se a Xerxes e participou na invasão pérsica. Combateu contra os
gregos na batalha de Salamina.
Salamina é uma das ilhas Sarónicas, no mar Egeu. Fica perto do porto do
Pireu, que serve Atenas. Forma com os territórios vizinnhos dois estreitos
canais que dão passagem para a baía de Eleusis. Em 480 a.c. defrontaram-se ali
a armada do império persa e a frota da aliança das cidades-estado gregas.
Após a morte de Dario, rei
da Pérsia, o seu filho Xerxes dominou a revolta egípcia e começou a preparar
uma nova invasão da Grécia.
No início de 480, o exército persa começou
a transpor o estreito de Helesponto, através de uma gigantesca ponte de barcas. Helesponto é o nome antigo do Estreito de Dardanelos.
300.000 guerreiros apoiados por elefantes e por máquinas de guerra
passaram assim da Ásia para a Europa. Era o exército mais numeroso até então
conhecido. Ao mesmo tempo, uma poderosa armada persa atravessava o Mar Egeu. Compunha-se
de mais de 1.000 galeras.
Tratou-se, como se vê,
duma ofensiva conjunta, por terra e por mar. Começava a Segunda Guerra Médica.
Os gregos também se
prepararam para a luta com antecedência. Sob a liderança de Temístocles, os
atenienses começaram a construir, a meio da década de 480, uma grande frota de
trirremes.
Atenas, isolada, não poderia enfrentar os persas. No fim de 481, reuniu-se em Corinto um congresso de
representantes de cidades gregas, do qual saiu uma inédita aliança confederada.
Note-se que as cidades gregas combatiam frequentemente umas contra as outras.
Passado o Helesponto, as
forças do imperador Xerxes caminharam ao longo das costas da Trácia e da
Macedónia, em direção a Atenas. Para avançarem por terra para o sul da Grécia
(Beócia, Ática e Peleponeso), era preciso transporem o desfiladeiro das
Termópilas. Os gregos bloquearam-no com uma pequena força de hoplitas
espartanos e tespios, comandada pelo rei de Esparta, Leónidas.
Os hoplitas eram soldados
de infantaria pesada. Usavam elmo, couraça, grevas e escudo e armavam-se de
lança e espada curta. Diz-se que constituíram a melhor infantaria do mundo até
ao advento das legiões romanas. Durante três dias, até serem traídos e flanqueados, detiveram o poderoso
exército persa. As mulheres e as crianças de Atenas tinham sido evacuadas para
a cidade peleponesa de Trecén.
Paralelamente, uma armada
grega, com predomínio de navios atenienses, tentou impedir o avanço da frota
persa nos estreitos de Artemísio.
As coisas correram mal
para os helenos: a retaguarda do seu exército foi desbaratada nas Termópilas,
enquanto as suas forças navais sofriam perdas importantes na batalha de
Artemísio. A maior parte do exército grego conseguiu retirar.
Os persas ocuparam a Ática
e a Beócia. Restava aos gregos defenderem o Peleponeso, a que se tinha acesso,
por terra, pelo istmo de Corinto. O único caminho foi destruído, enquanto se
elevava uma muralha. No estanto, defender essa passagem serviria de pouco, a
menos que os navios gregos fossem capazes de travar a poderosa armada persa. A
frota reagrupou-se junto à ilha de Salamina, no golfo Sarónico.
Segundo Heródoto,
Temístocles dispunha de 378 trirremes, enquanto as embarcações persas seriam
600 a 800. Note-se que o historiador Heródoto nasceu em Halicarnasso, quatro anos antes da batalha de Salamina. Os seus escritos são considerados a principal fonte de informação para o estudo das Guerras Médicas. O poder naval persa fora abalado por duas tempestades que afundaram
perto de um terço dos seus navios. O líder ateniense dispôs-se a lutar novamente.
Considerava que uma batalha a curta distância favorecia os navios gregos. Nos
estreitos de Salamina a armada persa não poderia adotar a habitual formação de
combate.
Artemísia não era apenas
valente, mas também astuta. Conhecia os seus compatriotas, contra quem lutava.
Tentou prevenir Xerxes contra a armadilha montada por Temístocles. Segundo
Heródoto, a rainha achava que não havia pressa em combater no mar. Com a armada
persa próxima, os gregos acabariam por dispersar. Cada grupo fugiria para a sua
cidade.
A lutar, deveriam fazê-lo
em mar aberto. Os persas dispunham de muitos mais navios e eram melhores
marinheiros.
Para os gregos, a única
possibilidade de vencer o inimigo residia em atraí-los para um estreito, onde
poderiam passar poucos navios de cada vez.
Artemísia não foi ouvida.
Xerxes pretendia travar um combate definitivo. Mandou instalar um trono na encosta do monte Aigaleo, com vista para o estreito. Pretendia testemunhar a vitória da sua esquadra.
A força naval persa
desorganizou-se, ao penetrar nos estreitos. Salamina foi para os persas um erro
estratégico e uma batalha desnecessária. Fizeram os que os seus inimigos
pretendiam que fizessem.
Era costume, no
Mediterrâneo, os navios tentarem abalroar as embarcações inimigas com os
esporões, passando depois à abordagem. Foram afundados para cima de 300 navios
persas e morto o almirante Ariamenes, irmão de Xerxes.
Heródoto conta que o navio
de Artemísia foi perseguido por trirremes gregas. Para escapar, terá içado a
bandeira de Esparta. Investiu contra outro barco persa e afundou-o, enganando
os atenienses que desistiram de a perseguir.
Xerxes
retirou, deixando parte do seu exército, sob o comando do general Mardonio,
para completar a conquista da Grécia. No ano seguinte, os persas foram batidos
na batalha terrestre de Plateia e no confronto naval de Mícala. A ameaça persa
sobre as cidades gregas esfumava-se.
A batalha de Salamina representa
um ponto de viragem na história da Grécia e da Europa. Se os persas tivessem
vencido, a nossa cultura atual seria outra.
Artemísia sobreviveu à
batalha. Implacável com os seus inimigos, a rainha acabou, porém, por sucumbir
numa guerra interior. De volta a casa, apaixonou-se pelo belo e jovem Dárdano,
de Abydos, que desdenhou dela.
A rainha não sabia perder.
Mandou arrancar os olhos ao homem que amava e lançou-se ao mar no rochedo de
Leucades.
Artemísia de Halicarnasso
foi, na História da Humanidade, a primeira mulher a dirigir em batalha uma
frota de navios. Ninguém sabe quantas embarcações comandou. Há quem fale em
cinco e quem indique cem.
A cidade de Halicarnasso
ficou conhecida pelo seu mausoléu, uma
das sete maravilhas do mundo. Foi mandado construir, 150 anos após a batalha de
Salamina, por uma rainha com o mesmo nome, da mulher almirante. Artemísia II pretendia honrar a
memória do seu irmão e esposo, o rei Mausolo. Permaneceu quase intacto durante
16 séculos, até ser destruído por terramotos sucessivos.
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