DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011


                     ÁFRICA A PÉ
            
                             FALSA LARGADA

Era preciso desenhar um atlas geral das colónias portuguesas. Manuel Pinheiro Chagas, ministro da Marinha e do Ultramar, criou em 1883 uma Comissão de Cartografia, para a qual nomeou como vogais os conhecidos exploradores Hermenegildo Capello e Roberto Ivens. Pouco depois, pretendendo criar uma rota comercial por terra entre Angola e Moçambique, encarregou esses dois oficiais da Armada de efetuarem, no terreno, os reconhecimentos necessários.
A razão da escolha era lógica: os oficiais de marinha estavam familiarizados com as técnicas de orientação marítima, parte das quais se adaptava à terra firme, e ambos tinham viajado pelo interior de África. Isto foi antes do G.P.S...
Capello e Ivens optaram começar a viagem em Pinda, junto a Porto Alexandre. Era um dos últimos locais povoados do sul da costa angolana. Entre outras razões para a escolha, contou a curiosidade de reconhecer o curso do rio Coroca e de saber se ele tinha alguma relação com o grande Cunene.
Sobre Porto do Pinda, ouçamos o relato de António Norberto Kudzki, datado de 1855:

A baía ocupa o espaço de nove léguas, sendo fechada, do lado do norte, pela ponta do Cabo Negro e do lado sul, pelas areias que cercam a pequena enseada denominada Porto Alexandre. Do mar, o aspeto do território é árido; nem uma árvore, nem um sinal de vegetação se oferece à vista; apenas uma cordilheira de rochedos do Cabo Negro se estende para sueste; só as dunas de areia se divisam, e algumas lagoas na foz do rio Coroca, formadas pelas enchentes do mesmo e pelo mar. 


Todo o território em geral e mais de três léguas do mar para o interior, são areias finas, soltas e movediças formando dunas, montes, vales de diferentes aspetos que os violentíssimos ventos do sudoeste continuamente removem, dando-lhes a aparência de incessante ondulação.


Capello e Ivens partiram, deserto fora, em direção à fazenda de S. Bento do Sul onde chegaram, fatigados, depois de caminharem durante 17 horas pelo leito do Coroca, onde não se via gota de água.
Pediram ao soba local que lhes cedesse carregadores para transportarem alimento até ao Cunene. O soba recusou. Não sabia de ninguém que tivesse chegado lá e voltasse. Iriam todos morrer.


Mesmo sem os reforços pretendidos, Capello e Ivens seguiram rio acima.
No dia seguinte, os carregadores fugiram, depois de saquearem a bagagem que transportavam. Os exploradores percorreram em 25 horas as 54 milhas que iam do último acampamento até Moçâmedes, onde foram hospitaleiramente acolhidos pelo governador.
No dia seguinte, apareceu o primeiro grupo de fugitivos. Naquelas paragens inóspitas, não havia muito para onde ir. Os oficiais da Armada acabaram por recuperar metade dos carregadores da expedição.
Regressaram a S. Bento e seguiram o curso do Coroca durante seis dias. Trata-se de um rio torrencial, que só existe de facto quando chove nas vertentes da serra da Chela. Não podia ter ligação com o Cunene, que fica mais para sul.
A exploração foi interrompida por uma cheia repentina do rio. Lá voltaram a S. Bento e depois a Moçâmedes. Reuniram os elementos dispersos da expedição e prepararam nova partida.


Referências:
De Angola à Conta-Costa, de Capello e Ivens.
Annaes do Conselho Ultramarino: baía e Porto de Pinda, Mossãmedes, por Marcelino Kudzki. Retirado do blogue Mossâmedes do antigamente.
Fotografias: 
Blogue Mossâmedes do antigamente
  

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