DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

terça-feira, 27 de março de 2018




COINCIDÊNCIAS

Há cinco dias, pouco antes da hora do jantar, ouvi tocar à campainha. Eu estava cá em cima, no escritório. A minha mulher preparava a refeição, enquanto o meu neto António se entretinha com um jogo de computador.


A São abriu a porta. Quem tinha tocado era um bombeiro alto, com fato de trabalho limpíssimo. Estava outro colega, logo atrás.
− Têm fogo em casa?
− Fogo? Nós?
A minha mulher chamou-me.
− Desce, que estão aqui os bombeiros.
Desci.
− Têm a lareira acesa?
− Sim, respondi. – Como quase todos os dias, quando faz frio.
− Podemos entrar?
− Com certeza!
Entraram. Na lareira ardia um lume baixo. A sala tinha o aspeto do costume.
− Não notaram nada de especial?
Eu e a São entreolhámo-nos. Foi ela que respondeu:
− Não.
− Bem… Telefonaram para o quartel a avisar dum fogo que saía da chaminé.
− A chaminé está a arder? – Perguntei eu.
− Não. Só se vê fumo.
Saí com eles e fiquei surpreendido. Tinha ouvido o som de sirenes mas, como eram frequentes, não lhes dera importância. Frente à minha porta, estavam estacionados dois camiões de combate a incêndios e dois jipes. As luzes piscavam e o trânsito na rua havia sido interrompido. Um magote de curiosos juntara-se no passeio oposto. Da chaminé, saia o fumo do costume.
Atravessei a rua. Estavam lá alguns rostos conhecidos.
− Eu vi chamas a sair duma chaminé – declarou um vizinho que eu conhecia de ver passar a passear o cão.
− Da minha?
− Não sei bem. Era dessa direção...
Presumi que tivesse sido ele a dar o alarme.
O bombeiro que me tocara à campainha – supus que fosse o chefe – declarou:
− Foi alarme falso. Vamos embora.
Agradeci-lhe, do coração, porque me tinham feito sentir protegido. Abriguei-me do vento na portada. Fazia frio.
Os veículos dos bombeiros foram-se embora e o trânsito voltou à normalidade.
Acho que nunca tinha mandado limpar a chaminé. Era coisa que tinha já tardado demais.
Na manhã seguinte, encontrei na caixa do correio um cartão de propaganda dum limpa-chaminés. Coincidência?



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