DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

ONDE ESTÁ O TSIPRAS PORTUGUÊS?

 

 Alexis Tsipras é presidente do partido grego Synaspismos e líder da coligação da esquerda radical grega SYRIZA. É também o primeiro-ministro do seu país desde janeiro de 2015.
 Enfrenta, neste momento, grandes dificuldades nas negociações com as instituições europeias e com o FMI, sendo uma incógnita o futuro próximo da Grécia. O país poderá sair da zona Euro e, eventualmente, abandonar a União Europeia, dentro de dias ou meses.
 Desencadeou, contudo, uma onda de fundo contra o poder instituído no velho continente e pôs em causa a estabilidade dos partidos políticos convencionais. O seu exemplo deu frutos noutros países.


 Na vizinha Espanha, o partido Podemos, que desfralda a bandeira do combate contra a austeridade, obteve recentemente resultados históricos nas eleições municipais e regionais. Deverá integrar a coligação que vai governar Barcelona e aproximou-se do poder em Madrid. Politicamente colocados mais ao centro, os Ciudadanos conseguiram também votações expressivas. O Partido Popular, no poder, e o PSOE, terão perdido a hegemonia eleitoral a que os espanhóis os habituaram.
 No SYRISA e no Podemos, os resultados eleitorais estão em relação com os carismas dos seus líderes e o modo como souberam canalizar o desagrado pelas políticas de austeridade levadas a cabo pelos governos de direita.
 O primeiro-ministro grego Alexis Tsipras vai apenas nos 40 anos e militou na juventude comunista. É licenciado em engenharia e tem algumas pós-graduações. Num discurso em Berlim, em maio de 2014, manifestou a sua oposição à política neo-liberal, vigente na Europa sob a batuta de Angela Merkel.
 Levou o SYRISA à vitória nas eleições gregas de 25 de janeiro de 2015, obtendo 36% dos votos e garantindo 149 dos 300 lugares no parlamento.
 Foi nomeado primeiro-ministro. No decurso da primeira reunião do seu gabinete, expôs as suas prioridades para o governo da Grécia: combater o desemprego e a crise humanitária, negociar com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional a reestruturação da dívida grega e cumprir as promessas eleitorais do SYRISA, incluindo o fim das privatizações.
 Passemos para Espanha. Pablo Iglésias é escritor, professor universitário e apresentador de televisão. Usa, emblematicamente, o cabelo comprido seguro na nuca com uma fita e tem-se mostrado capaz de mobilizar o descontentamento de boa parte do eleitorado espanhol. O seu partido está a crescer e ninguém sabe onde irá parar. Poderá, contudo, acompanhar o destino do SYRIZA, em quem boa parte da esquerda europeia depositou a sua esperança.
 Aparentemente, a crise económica fez-se sentir com maior intensidade em Portugal do que em Espanha e seria de esperar uma evolução política semelhante.
 Onde é que estão o SYRISA português e o seu Tsipras?
 Terá ocorrido dedo demais a eclosão de um líder carismático na esquerda portuguesa. Francisco Louçã, economista de grande prestígio, coordenou o Bloco de Esquerda de 2005 a 2012. Ao longo desse tempo, apresentou no Parlamento uma série considerável de projectos inovadores, obtendo mesmo a aprovação de uns tantos.


 O Bloco de Esquerda conseguiu eleger oito deputados nas legislativas de fevereiro de 2005. No mesmo ano, Louçã foi nomeado porta-voz da comissão Política do Bloco. Nas eleições legislativas de setembro de 2009, o BE aumentou para 16 o número de deputados eleitos, tornando-se na 4ª força política do país.
 A euforia não iria durar muito. Nas eleições legislativas de 2011, o Bloco de Esquerda viu reduzir para metade a sua representação parlamentar. As divergências internas acentuaram-se. No ano seguinte, Francisco Louçã abandonaria a liderança. Aparentemente, os seus sucessores não souberam tirar partido das condições políticas extremamente favoráveis ao desenvolvimento de soluções políticas alternativas.
 O “Barómetro Eurosondagem” de meados de maio de 2015 mostra as intenções de voto no Partido Socialista um pouco à frente da coligação PSD/CDS. A CDU anda pelos 10 % e o Bloco de Esquerda não chega aos 5%. O PDR de Marinho Pinto ronda os 2,5 %, enquanto o Livre fica abaixo dos 2%.
 Se olharmos para as sondagens da Aximage da mesma altura, veremos equilibradas as intenções de voto no PS e na coligação que está no governo. A CDU ronda os 7,7 % das intenções de voto, enquanto o Bloco de Esquerda ultrapassa ligeiramente os 4 %. O Livre/ Tempo de Avançar alcançaria 2% dos votos e o partido de Marinho Pinto teria pouco mais de 2,5. As conclusões são fáceis de tomar: os portugueses desconfiam dos resultados das mudanças políticas bruscas e, ainda que com a fé reduzida, continuam a acreditar mais nos partidos tradicionais.
 Louçã fará 60 anos em 2016. A evolução da situação política europeia poderá não esperar pelo surgimento de um novo líder carismático na esquerda portuguesa. Entre nós, o necessário “arejamento” do sistema político-partidário corre o risco de ficar adiado para as calendas gregas.

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