DE CÁ E DELÁ

Daqui e dali, dos lugares por onde andei ou por onde gostaria de ter andado, dos mares que naveguei, dos versos que fiz, dos amigos que tive, das terras que amei, dos livros que escrevi.
Por onde me perdi, aonde me encontrei... Hei-de falar muito do que me agrada e pouco do que me desgosta.
O meu trabalho, que fui eu quase todo, ficará de fora deste projecto.
Vou tentar colar umas páginas às outras. Serão precárias, como a vida, e nunca hão-de ser livro. Não é esse o destino de tudo o que se escreve.

sábado, 18 de setembro de 2010

CRÓNICAS DO MAR


AS PRAGAS DOS NAZARENOS


Os pescadores de bacalhau eram provenientes de diversas povoações costeiras do continente português e também dos Açores. Noutro tempo, as mulheres vestiam-se de preto, à largada dos navios, e só retiravam o luto quando os seus homens regressavam. Eram "viúvas de vivos".

Ao rebentar a guerra colonial, os navios passaram a recrutar as companhas também no interior do País. Para escaparem à tropa, os rapazes embarcavam durante cinco viagens consecutivas ou seis intervaladas. Alguns nunca tinha visto o mar até à véspera do embarque.

Quando se fala em bacalhau há, contudo, terras que saltam logo para a ponta da língua: Ílhavo para os oficiais, Caxinas e Nazaré para os pescadores.
Os nazarenos constituíam um grupo com certa identidade. Dizia-se que, quando se viam em grande aflição no mar, em vez de lutarem até ao fim pela sobrevivência, se abraçavam uns aos outros, dizendo:

- Ao menos morremos juntos, meus irmãos!

Algumas das pragas inventadas na Nazaré correram mundo, a bordo das embarcações de pesca. Recordo umas tantas:

- Haviam de te nascer tantos cornos na testa quantos de ovos são precisos para partir a proa ao navio!

- Havias de encontrar no chão uma carteira cheia de dinheiro e, quando te baixasses para a apanhar, caía-te a caixa do peito!

- Havia de te dar uma dor que, quanto mais corresses mais te doesse e, se parasses, rebentavas!

- Que o mar seja fogo e o céu gasolina!
Nunca ouvi lançar uma praga de viva voz. Eram gentis e pacíficos os pescadores da Nazaré com quem naveguei.
Foto: net

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