Graças ao esforço de um punhado de etnólogos, entre
os quais será justo destacar Héli Chatelain, Carlos Estermann, e Alfredo
Hauenstein, dispomos de uma recolha apreciável de histórias, provérbios, lendas
e canções, que constituem o tesouro literário dos povos de Angola.
Esta literatura, muito rica, é pouco conhecida entre
nós. A maior parte dos textos está apenas ao alcance de especialistas. Iniciativas
com as de Pires de Lima, que orientou a edição portuguesa da obra de Héli
Chatelain, ou de Viale Moutinho, que apadrinhou a publicação de parte destes
contos “traduzidos” para português moderno, não tiveram continuidade suficiente.
Mitos e fábulas podem ser agrupados de forma diversa.
São numerosas as histórias protagonizadas por animais. Muitas narrativas falam
de monstros ou papões comedores de gente, enquanto que outras descrevem episódios
da vida diária. Os contos que contêm elementos mitológicos são menos
frequentes. É comum, em todos os géneros, a presença de ensinamentos morais.
Os investigadores registaram as palavras dos
narradores. Nota-se, nesses escritos, a preocupação da objectividade e do
rigor, estranhos afinal ao processo de contar histórias. As recolhas foram
levadas a cabo antes da divulgação das máquinas de filmar. Não foi possível
fixar os gestos nem a mímica. Menos se poderiam guardar as inflexões e as
mudanças do enredo proporcionadas pela reacção da assistência ou moduladas pela
disposição do contador. O acto de contar é criativo…
As vozes guardadas arrefecem. Os contos, para
reviverem, devem ser recontados.
Foi o que procurei fazer. O objectivo do presente
trabalho é divulgar uma escolha de contos angolanos tradicionais, narrando-os
de forma adaptada ao jeito europeu. Tentei não modificar o essencial das histórias
e respeitei as linhas gerais do texto. Fiz uso, aqui e ali, da liberdade
permitida aos contadores.
A divulgação do património cultural específico de
cada povo ou região poderá contribuir para desenvolver um sentimento de
pertença mútua entre as populações dos países de língua oficial portuguesa.
Quem olhou por dentro dois mundos goza de um estranho
privilégio: por mais desfocada que a visão tenha sido, apreciada do fundo da
memória aparecerá sempre como a soma de dois faróis.
Anos mais tarde (2018), o livro foi também
publicado on line com o título “Contos Tradicionais
angolanos”.
A capa baseia-se na lindíssima pintura
"Mucancala” da Maria Antónia Neuparth.
Referências:
Europress 2004
Kindle (Amazon) 2018
Sem comentários:
Enviar um comentário