quinta-feira, 26 de janeiro de 2017


TAMEGÃO


CARLOS NUNES PINTO


III
                                    

“ A gente é como o rio: quando corre tem um nome, quando entra no mar fica só Mar. “

− Bom dia, menino.
Fiquei admirado ter sido ele o primeiro a cumprimentar.
Só podia haver duas razões: ou estava ansioso que eu chegasse ou já estava a gostar de conversar comigo. Penso que a segunda hipótese era a mais correcta.
− Menino, hoje quem vai perguntar sou eu. Porque é que o mar precisa de tanta água e não é ele que vem buscar? O rio é que leva lá…
Era a minha grande oportunidade. Ia dar uma lição de ciências, ainda tão fresquinhas na minha cabeça.
− É por causa da gravidade.
− O quê, tem coisa grave aí?
− Não, este Mundo tem uma força que puxa todos os corpos para baixo, para o centro da Terra, por isso é que a gente não anda por aí sempre a voar.
Como queria ser ele sempre o sabichão, retorquiu:
− Eu já sabia isso, estava só a brincar! Sabe, as minhas mangas quando caem não vão a voar para o quimbo dos outros, senão eles é que comiam. Caiem mesmo aqui neste chão. Sabe, tal força é tão grande que puxa a manga para baixo, o pau é fraco e se parte. Quando puxa a manga ela não fica igual às outras, se estica e fica com aquele bico na ponta. Mas tangerina já não é assim porque tem um pau mais forte, e a força faz tanta força que a tangerina se puxa para cima e fica lisa no fundo. Quando a gente quer arrancar a tangerina, às vezes ainda fica um bocado de casca agarrada no pau.
Aproveitei a história da tangerina para continuar a minha lição.
− O Mundo é redondo como uma laranja, mas em cima e em baixo é mais direito…
− Oh! O Mundo é redondo?! Então como é que a gente não cai?
− Por causa da gravidade. Ainda te vou dizer mais: a terra, em cima e em baixo, está tapada de gelo.
−É por causa dos mosquitos?
− Não só, Tamegão, não só...
As minhas lições não estavam a resultar.

Saí triste, pisando cabisbaixo aquela terra de magia, onde as ideias de cada um valem muito mais que todas aquelas que lhes querem impingir.  

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