terça-feira, 17 de janeiro de 2017


EU E A PESCA

I

O meu neto Vasco pediu-me que o levasse a pescar. A ideia não pode ter nascido na cabeça dele. Tem cinco anos e só viu peixes vivos no Aquário Vasco da Gama. Foi a minha filha mais velha que inventou mais uma maneira de o aproximar do avô.
A pequena conversa serviu para me avivar a memória. Durante boa parte da minha vida, fui pescador, ou fingi sê-lo. Pesquei os primeiros peixes no Rio Cunene, na parte de cima das cataratas do Ruacaná. 


Ia nos catorze anos e viajara, numa excursão da Mocidade Portuguesa, até perto da fronteira de Angola com o Sudoeste Africano (atual Namíbia). Alguém levara linha e anzóis. Não me lembro quem foi, mas estou certo de não ter sido eu. Os peixes desconheciam essas modernices e deixaram-se apanhar.
Fiquei a pensar que aquilo era fácil.
No regresso ao Lubango, onde morava, tentei fisgar o Senhor Messias. Era um bagre grande que morava no poço do quintal da minha amiga e vizinha Fernanda. 


Aquilo era praticamente um aquário e o peixe era de estimação. Velho e astuto, mostrou-se indiferente aos variados petiscos que eu lhe fui propondo no anzol. Passaram sessenta anos. Que são sessenta anos? Se calhar, o Senhor Messias ainda lá nada.
A vida puxou-me para fora do Lubango e, a dada altura, levou-me para o norte do Oceano Atlântico. Ocasionalmente, o Gil Eannes fundeava em locais onde havia peixe. Eu e o meu colega Barros Pereira tínhamos muito tempo livre e entretínhamo-nos a pescar. Eram quase sempre solhas, que o cozinheiro aproveitava para variar a ementa.
No total das duas campanhas, passei três meses em navios de pesca à linha, com dóris. De vez em quando, as embarcações calhavam em fundos onde o bacalhau abundava. Certo dia, na costa da Gronelândia, perto do Círculo Polar Ártico, apanhei mais de cento e cinquenta quilos de bacalhau. Metade dos pescadores do Neptuno capturaram menos do que eu. Fiquei com as mãos gretadas pelo fio de nylon da azagaia, mas a fossanguice impedia-me de parar. 


     Mais tarde, e durante anos a fio, dediquei-me à pesca na Baía de Setúbal. Falarei disso noutra ocasião.


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