domingo, 8 de fevereiro de 2015

           
             JE NE SUIS PAS CHARLIE!

                                       I



Ao atingirem o coração da Europa, os atentados de 7 de Janeiro em Paris obtiveram um impacto excepcional no imaginário ocidental. No entanto, o número de vítimas mortais esteve bem longe das duas mil pessoas massacradas na mesma semana pelos militantes do Boko Haram na Nigéria enquanto passou quase despercebida a explosão de um carro armadilhado na capital do Yemen que provocou cerca de 40 vítimas. 
      Poderemos estar perto duma guerra global.



 Os assassinatos dos cartoonistas franceses do Charlie Hebdo e as mortes ocorridas em ataques separados vieram relançar o debate sobre o terrorismo islâmico e os modos de o combater. As respostas iniciais ficaram-se, tanto quanto sei, pelo reforço das medidas de segurança, incluindo a troca atempada de informações entre as várias polícias nacionais e a eventual restrição da livre circulação de pessoas no espaço Schengen.


A resposta visível da opinião pública europeia foi marcadamente emocional. Cerraram-se fileiras em torno da sagrada liberdade de expressão e agudizou-se o ódio aos muçulmanos. Lembre-se que circulam, há anos, na Internet, mensagens de conteúdo xenófobo, alertando para o risco de submersão da sociedade ocidental, tal como a idealizamos, face à presença crescente das gentes de credo muçulmano.
Não é, aliás, possibilidade que a História desminta. Aconteceu no Líbano nos anos 50 a 80 do século passado. 


     O Líbano, a que chamavam «Suíça do Médio Oriente) era o país mais rico e estável da região. A população era cristã maronita (51% dos habitantes, em 1926), e muçulmana (49%), com largo predomínio de sunitas. A criação do Estado de Israel levou ao exílio de muitos palestinianos para os países vizinhos, incluindo o Líbano. Esta emigração, aliada a uma taxa mais elevada de natalidade entre os muçulmanos, modificou a demografia, tendo os cristãos passado a ser minoritários. Em Abril de 1975, teve início uma guerra civil que duraria dezasseis anos e deixaria parte do país em escombros.


A emigração de muçulmanos para a Europa não tem parado de crescer. É particularmente importante na Espanha, França e Reino Unido, que tiveram colónias muçulmanas, e na Alemanha, onde existe uma importante comunidade de origem turca. Em Portugal, uma em cada 200 pessoas segue os ensinamentos do Profeta. Encontram-se nas grandes cidades do mundo gentes de todas as raças e religiões.
Não disponho de dados que me permitam avaliar, na generalidade, a adaptação das minorias maometanas aos países de acolhimento. Atrevo-me a supor que é globalmente boa e que a maior parte dos muçulmanos pretende trabalhar e, se possível, prosperar em paz. Haverá falhas graves na integração, como o demonstra o facto de estarem continuamente a surgir radicais islâmicos nos países ocidentais. Se, desde 2011, 1200 cidadãos franceses se juntaram aos grupos islamitas que combatem na Síria e no Iraque, haverá práticas profundamente erradas no modo como a Europa aborda a coexistência de culturas. Em casos de divórcio, é pouco comum que a culpa seja unicamente dum dos cônjuges.


As declarações repetidas dos líderes islamitas radicais vão no sentido de alargar a «guerra santa». Uma parte dos muçulmanos, em vez de aceitar os valores e códigos de vida das sociedades em que se instala, pretende repor o antigo império árabe. Lembre-se que a península ibérica foi colonizada pelo Islão durante perto de oito séculos (a partir de 711) e que os vestígios dessa ocupação são ainda aparentes entre nós, nomeadamente na linguística. Basta lembrar que uma das maneiras de dizermos «Deus queira» é «oxalá». Curiosamente, já na vigência da nossa primeira República, o uso da «burka» (bioco) voltou a ser proibido em Olhão. 


                                                                                                     Continua

Sem comentários:

Enviar um comentário