quinta-feira, 30 de janeiro de 2014



Capítulo XV

(continuação)

Quando já toda a gente estava reunida, Lasone começou a explicar.
─ A única maneira de fazer com que Joshua tenha visões sem esperarmos é induzi-lo num coma. E, obviamente, não está provado que seja seguro ou que funcione. Se o senhor não quiser aceitar, todos os que aqui estamos compreenderemos.
─ Eu não sei. E se isso me matar? O “dom” desaparece do mundo para sempre. Tenho de pensar.
Dito isso, retirou-se para o quarto.
Durante a explicação de Lasone, Mellie tinha estado pensativa. Não queria que Joshua soubesse, mas ela tinha tanto medo como ele. Se algo de mau acontecesse, além do “dom” acabar, perderia a pessoa que mais amava. Quando o namorado abandonou a sala para refletir sobre o assunto, seguiu-o e disse:
─ Não quero que faças isso! Se tu morreres, além do “dom” acabar, tu desapareces para sempre! Tu és mais importante que um simples “dom”!
─ A minha vida não salva outras, mas o “dom” pode salvar! ─ Exclamou MacLarens, tentando não chorar.
─ Não digas essas coisas! Tu és muito mais importante para mim que o “dom” e não quero que te aconteça o que aconteceu ao Marc!
Ficaram a discutir até que, na conversa, adormeceram numa longa noite.
No dia seguinte, mal o sol nasceu, Joshua aproximou-se de Lasone e disse, seriamente:
─ Eu aceito.
Nesse dia, não falou com mais ninguém nem saiu do seu quarto. Estava quase como que arrependido da sua decisão. Por um lado, queria ajudar a descobrir o assassino mas, por outro, temia pela própria vida.
À noite, após acabar o seu turno, Nicole foi conversar com o jovem. Bateu à porta e, após não obter resposta, entrou. MacLarens estava na sua secretária, a mexer nas peças dum relógio. Após aquela situação toda, a única coisa que ainda tinha em comum com a sua antiga vida era a sua paixão pelos relógios, pois estes sãos os únicos que podem parar o tempo.
─ Joshua, posso falar contigo? ─ Perguntou a mulher.
─ Claro – disse, rodopiando a cadeira ─ sobre o que quer conversar?
─ Reparei que não disse uma única palavra e fiquei preocupada. Eu entendo o seu receio em pôr-se em coma, mas também sei que é como uma obrigação para si, por isso eu percebo. Por essa razão, estarei sempre disponível para conversar.
─ Muito obrigado, Nicole! Pela sua maneira de falar, até parece que já passou por uma situação parecida.
De repente, um silêncio estranho encheu a sala. Assim permaneceu até que chegou à conclusão que a agente tinha algo a esconder.
─ O que é que não me está a contar? ─ Inquiriu Joshua.
─ Eu não conheci só Marc. Também conheci o seu pai. Este disse-me que o “dom” já tinha pertencido ao meu tetra-avô, o familiar mais próximo que temos em comum ─ explicou Nicole, assustada com a possível reação de Joshua.
─ Isso quer dizer que se o “dom” tivesse passado para o seu trisavô, em vez de ter passado para o meu, era você a possessora do dom?
─ Temo que sim.
Nessa noite, Joshua esteve a pensar em tudo o que Nicole lhe dissera. Logo de manhã, Lasone chamou-o para lhe induzir o coma.
Assim que o fez, Joshua começou com os sonhos. Não conseguiu descobrir muito no início mas, ao longo do tempo, começaram a ser mais explícitos.
Enquanto MacLarens sonhava, a casa foi acordando. A primeira pessoa a fazê-lo foi Mellie. Dirigiu-se para o quarto de Joshua para o acordar, mas este não estava lá. Gritou pela casa toda, até que Fréderique lhe contou o acontecido.
A cientista começou a chorar. Os seus olhos verdes brilhavam agora mais do que nunca. Passados alguns minutos, Nicole apareceu e seguiu o choro, até encontrar Mellie deitada na cama de Joshua.
Abraçou-a e tentou animá-la, mas em efeito. Depois, contou-lhe exatamente o que havia contado a MacLarens na noite anterior.
─ Então, se não fosse Joshua a ter o “dom”, serias tu? ─ Perguntou Mellie, confusa.
─ Sim, provavelmente. Mas talvez na minha família o “dom” já tivesse sido destruído.
─ Por que dizes isso?
─ Porque, na minha família, não precisariam do “dom” para serem assassinados. Sempre foram polícias e os polícias não duram para sempre. Mas eu também não gostaria de possuir o “dom” ─ afirmou Nicole.
─ Mas por quê?
─ Porque ter o “dom” significa ter um nível de responsabilidade a que eu não estou disposta a chegar. A Mellie gostava de o possuir?
─ Sim, adorava. Ter o “dom” significa poder mudar o futuro e, consequentemente, poder mudar o mundo. Além disso, significa poder oferecer uma vida quase perfeita a todos, sem ninguém precisar de se esforçar.
A agente ficou espantada com a resposta de Mellie, mas não teve tempo de responder pois, nesse momento, Mitch entrou no quarto, ainda meio a dormir.
─ O que se passa? ─ Disse, bocejando. ─ Ouvi choro aqui e fiquei preocupado.
─ Não se passa nada ─ afirmou Mellie, tentando esconder as lágrimas.
─ Sabes que eu não acredito. Contem-me o que aconteceu! Eu já não sou nenhuma criança para me esconderem coisas importantes.
─ O Joshua entrou em coma de madrugada. Agora, só resta esperar ─ informou Nicole.
Após Nicole lhe ter dado esta informação, Mitch parou uns segundos. Quando recomeçou a falar, não evidenciou Joshua na conversa. Não valia a pena ficar triste antecipadamente.
Enquanto a criança falava, Mellie foi parando de chorar, limpando as lágrimas e conversando. Por muito que tentasse, não conseguia perceber como Mitch podia estar feliz, estando Joshua em coma. Mesmo assim, não voltou a tocar no assunto.

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