quarta-feira, 17 de abril de 2013


                                               

                        AMíLCAR CABRAL 

                                     VIII

                      SPÍNOLA

                   (Excerto do livro Portugal e o futuro)



O que importa reter é que a guerra subversiva é uma guerra total, à qual a população não pode, ainda que o queira, ser indiferente. Contrariamente ao que sucedia com os conflitos clássicos, em que a população era um fator poderoso mas não decisivo, aqui ela é o fulcro e o objetivo de toda a ação, só triunfando o partido que a tiver do seu lado. 
Como pode terminar uma guerra deste tipo? Analisemos em tese as diferentes possibilidades.
Poderia admitir-se que o conflito terminasse pelo aniquilamento das forças de guerrilha. Em relação a esta hipótese há porém que concluir desde já pala sua inviabilidade, pelo menos num horizonte-tempo definido.
A guerrilha, pela sua técnica de ação dispersiva, não carece de grandes efetivos para levar a cabo a sua missão de desgaste; e sendo assim, o recrutamento das forças de subversão, voluntário ou coercivo, entre a população, por mais diminuto que seja será sempre suficiente.
A natural fluidez das fronteiras limítrofes das áreas de guerrilha torna inesgotável o recurso ao recrutamento externo, sem qualquer hipótese de denúncia.
Parece, portanto, de excluir a vitória por aniquilamento físico do inimigo dada a sua possibilidade de constante renovação.
Poderia ainda aceitar-se o termo da guerra pela cessação coerciva da atividade das forças da subversão, uma vez privadas as guerrilhas do seu reabastecimento em víveres, material e munições. Em relação a este ponto a experiência tem largamente demonstrado que as forças de subversão contam com apoio externo inesgotável e este facto, conjugado com a permeabilidade das fronteiras e o apoio ideológico dos países limítrofes torna utópico o sucesso de qualquer tentativa para isolar as guerrilhas.
Poderia tentar-se a vitória conquistando a adesão da população, levando-a à colaboração ativa contra o inimigo e fazendo-a participar na perseguição à guerrilha. Mas nesse caso, em boa técnica de subversão, a ação inimiga seria desviada para a violência sobre a população, em ordem a obter, com a sua adesão ou sem ela, a cumplicidade do silêncio. A população cede sempre à violência e identifica-se com o mais forte; e em tal hipótese, ou se sobrepunha à violência das forças de subversão outra superior, que no balanço fizesse pesar para o lado das forças da ordem a moral de circunstância – o que de forma alguma pode aceitar-se – ou ter-se-ia de assegurar à população proteção eficaz, o que implicaria um volume de forças incomportável para qualquer país. Assim, pela persuasão ou pela violência, a conquista das populações resulta anulada.
Poderia alcançar-se a vitória retirando às forças de subversão a vontade de combater pela adesão da sua massa à causa da ordem estabelecida, ou levando os interesses que as apoiam a retirar o seu auxílio. Em qualquer dos casos, porém, seria uma vitória política e não militar.
Podemos assim chegar à conclusão que, em qualquer guerra deste tipo, a vitória exclusivamente militar é inviável. Às Forças Armadas apenas compete, pois, criar e conservar pelo período necessário – naturalmente não muito longo – as condições de segurança que permitirão soluções político-sociais, únicas capazes de pôr termo ao conflito.

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