CRÓNICAS DE NOVA IORQUE
I
CHEGADA
A nossa chegada Nova Iorque ficou
assinalada pelo encontro com um agente de polícia de fronteira invulgarmente
grosseiro.
Ao longo da vida, visitei três dezenas de
países espalhados por cinco continentes e nunca tinha visto tanto desprezo
pelos turistas. O chui nem precisou de falar para mostrar que era uma
cavalgadura: apontou para o modelo dum impresso que deveria ter sido
apresentado e com gestos bruscos de mão, mandou embora a minha mulher, que me
precedera na fila.
O nosso impresso estava corretamente
preenchido. Cabia um a cada família e levava-o eu.
Mudamos para a fila do lado. O polícia
era gentil. Resolveu-se de imediato o não problema.
Aqueles dois agentes ganham ambos o
mesmo, ainda que um deles transmita uma imagem péssima do seu país. Também
temos cá disso…
O direito à estupidez não está
claramente inscrito na constituição americana, mas há quem o exerça com
liberalidade. Vê-se gente frustrada que se agarra o melhor que pode a migalhas
de poder.
Há razões históricas para isso. Alguns
emigrantes, logo que se fixavam no país, passavam a hostilizar os que pretendiam
entrar.
Entre o princípio do século XIX e os
meados do século XX, Nova Iorque foi a principal porta de entrada de emigrantes
nos Estados Unidos. Os recém-chegados desembarcavam no que é hoje Downtown Manhattan,
nas docas das margens dos rios Hudson e East. Em 1855 foi criado em Castle
Garden o primeiro centro de controlo de emigrantes.
Sucedeu-lhe, em 1892, Ellis Island, junto
à estátua da Liberdade. Por ali passaram, ao longo de dezenas de anos, mais de
doze milhões de emigrantes. Uma minoria (à volta de 2%) era recusada e obrigada
a fazer a viagem de volta. A percentagem era baixa, porque a seleção começava a
ser feita nos portos de partida. Só vinha quem se julgava forte. Os Estados
Unidos aceitavam apenas gente cheia de saúde.
Diz-se que a América é terra de
oportunidades. É verdade que Gates e Rockfeller nasceram lá e que a maioria dos
cidadãos americanos consegue alcançar um modo de vida confortável. Gera,
contudo, muitos frustrados. A crispação é bem aparente no trânsito da cidade.
Os motoristas vão ralhando uns com os outros e com os peões por meio das
buzinas, tanto de dia como de noite.
Os animadores das viagens guiadas parecem tristes e um tanto loucos. Estarão fartos de repetir vezes sem conta longos discursos que pouca gente ouve. O espírito de competição enraizado na
sociedade americana tem o seu lado negativo: nem todos são capazes de ganhar.
Os que não chegam ao sucesso, os “losers”, são mal vistos pelos outros e nem sequer gostam
de si próprios.
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